Revista IstoÉ
A lista de governadores e ex-governadores investigados por
envolvimento em ilicitudes, que já tem os nomes de Rui Costa (PT-BA) e
Sérgio Cabral (PMDB-RJ), não para de crescer. Documentos inéditos
obtidos por ISTOÉ acrescentaram um nome de peso à lista: o governador de
Pernambuco, Paulo Câmara (PSB). Ele e o prefeito reeleito do Recife,
Geraldo Júlio (PSB), passaram a ser investigados em um inquérito no
Supremo Tribunal Federal sob suspeita de participação no
superfaturamento e irregularidades da Arena Pernambuco, construída pela
empreiteira Odebrecht.
ISTOÉ obteve com exclusividade um despacho sigiloso do
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, do último dia 3 de
novembro. Nele, Janot solicita ao ministro do STF Teori Zavascki que
mantenha no Supremo um inquérito único sobre Paulo Câmara, Geraldo
Júlio, o senador Fernando Bezerra (PSB-PE) e o deputado Tadeu Alencar
(PSB-PE). Esse inquérito já está aberto e autuado no Supremo, sob o
número 4292, e aponta fatos envolvendo os políticos com as
irregularidades.
O caso é proveniente da Operação Fairplay, deflagrada no ano passado
pela Polícia Federal em Pernambuco, mas foi tratado no Supremo como mais
um desdobramento da Lava Jato. Ao longo das investigações, os
investigadores constataram indícios do envolvimento de autoridades com
foro privilegiado. Por isso, remeteram em agosto o material ao STF.
Câmara tem foro privilegiado no STJ (Superior Tribunal de Justiça),
mas como também há envolvimento de um senador e um deputado federal,
Janot quer que todos sejam investigados no Supremo. Teori pediu que
Janot se pronunciasse sobre o inquérito, o que foi feito no último dia
3. O procurador-geral da República pediu a manutenção de uma única
investigação sobre os quatro políticos no Supremo e o desmembramento à
primeira instância para apurar envolvimento de empresários. Agora,
caberá a Teori dar o aval sobre o pedido.
Para Janot, há “indícios de irregularidades na atuação de dois
núcleos, um econômico, formado por Andrade Gutierrez e Odebrecht, além
de outras empresas; e um político, composto pelos então integrantes do
Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas do Estado de Pernambuco”. Os
quatro políticos, incluindo o governador Paulo Câmara, fizeram parte do
comitê e, nele, formataram a licitação que teve a Odebrecht como
vencedora. “A construção da obra não teria ocorrido sem a colaboração
dos agentes políticos que, primeiramente, autorizaram a construtora
Odebrecht a realizar estudos preliminares e elaborar o projeto básico da
obra, sem a realização de qualquer procedimento de licitação”, diz
relatório da PF transcrito por Janot.
A partir de um relatório da Polícia Federal, Janot cita suspeitas em
pagamentos feitos a esses políticos via doações oficiais da Odebrecht e
da empresa Projetec, responsável pela auditoria da execução do contrato
da arena. No caso de Paulo Câmara, ele recebeu R$ 200 mil da Odebrecht
para sua campanha a governador em 2014. Fernando Bezerra recebeu R$ 50
mil da Odebrecht e R$ 50 mil da Projetec. Tadeu Alencar, R$ 30 mil de
cada uma das duas.
Dentre as hipóteses consideradas na investigação estão a restrição à
competitividade da licitação, o pagamento de propina via doações
oficiais e até eventuais crimes contra o sistema financeiro relacionados
ao financiamento do BNDES. “Extrai-se que a superestimação do valor da
obra foi motivada para se burlar o teto do financiamento autorizado pelo
BNDES, que era de 75% de seu valor total, observado o teto de R$ 400
milhões. Com a superestimação do valor da obra, o BNDES acabou
financiando integralmente o seu custo, e não apenas 75%”, escreveu
Janot.
Há suspeitas de superfaturamento de ao menos R$ 42 milhões nas obras
da Arena Pernambuco, baseado em perícia encomendada pela PF, e do
favorecimento à Odebrecht pelo comitê gestor: a empreiteira foi
contratada, sem licitação, para realizar os estudos e projetos,
favorecendo-se para disputar e vencer a licitação. “As empresas do
conglomerado Norberto Odebrecht S/A tiveram, pelo menos, 463 dias
corridos a mais para estudar as melhores soluções para formulação da sua
proposta, pois elaborou o projeto básico do empreendimento, obtendo
assim significativa vantagem competitiva sobre eventuais licitantes
interessadas”, diz o relatório da PF.
No seu despacho, Janot determina à PF a realização de uma nova
perícia contábil para apurar o dano ao erário proveniente dos contratos e
o depoimento de quatro colaboradores, sendo dois da Odebrecht (Maria
Lúcia Tavares e Angela Palmeira Ferreira) e dois da Andrade Gutierrez
(Clóvis Primo e Rogério Nora de Sá).
A delação da Odebrecht, em fase final de negociação com a
Procuradoria Geral da República, também deve ajudar a elucidar os fatos.
Um dos executivos cotados para fechar delação é João Antônio Pacífico
Ferreira, responsável pela obra dentro da Odebrecht. Ele chegou a ser
alvo de mandado de busca e apreensão na Operação Fairplay. Procurada, a
empresa informou que não comentaria. À época da Operação Fairplay, a
Odebrecht soltou um comunicado dizendo que os preços do estádio foram
“absolutamente regulares” e que a licitação também foi regular.
Em nota, “O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, o prefeito do
Recife, Geraldo Julio, e o deputado federal Tadeu Alencar, como
ex-integrantes do Comitê Gestor de Parcerias Público-Privadas do Estado
de Pernambuco (CGPE), vêm a público prestar os esclarecimentos abaixo,
diante da reportagem publicada na edição online da revista Istoé:
1 – A licitação para a construção da Arena, ocorrida em 2009,
observou todos os requisitos, prazos e exigências da Lei de Concessões e
da Lei das Parcerias Público-Privadas, que preveem a possibilidade de o
autor do projeto participar da licitação, não decorrendo desse fato
qualquer irregularidade, fraude ou frustração do caráter competitivo da
disputa;
2 – A Arena Pernambuco foi entregue em junho de 2013 e custou R$
479.000.000,00 (base maio de 2009), tendo apenas 75% da sua construção
sido financiada pelo BNDES e sendo a mais barata entre as arenas
construídas no Brasil, levando em conta a capacidade instalada. O
restante do valor do contrato deveria ser pago durante a exploração do
Estádio (contraprestação para a operação da Arena);
3 – Não houve superfaturamento. O percentual do terreno da Cidade da
Copa foi validado pela Fundação Getúlio Vargas, não tendo sido
questionado pelo Tribunal de Contas da União e do Estado. O terreno não
foi entregue à Concessionária, continuando no patrimônio do Estado de
Pernambuco;
4 – Considerando que as receitas estimadas não se confirmaram, o
contrato de concessão foi rescindido, tendo os parâmetros utilizados na
rescisão sido aprovados pelo Tribunal de Contas do Estado, por meio de
formalização de Termo de Ajuste de Gestão (TAG);
5 – Importante destacar que o contrato de concessão foi aprovado pelo
Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Tribunal de Contas do Estado
de Pernambuco (TCE-PE), na decisão de número 0101011/2011, tendo sido
igualmente analisado, sem objeções, pelo Ministério Público Federal,
Ministério Público Estadual e BNDES;
6 – A análise encomendada pelo Governo do Estado de Pernambuco à
Fundação Getúlio Vargas está disponível no Portal da Transparência no www.transparencia.pe.gov.br.
Como têm feito todas as vezes que é provocado, o Governo do Estado de
Pernambuco e os ex-integrantes do CGPE, enquanto ocupantes de funções
públicas, estarão à disposição para prestar todas as informações
necessárias sobre a construção da Arena Pernambuco”.
JOGO SUJO
STF abriu inquérito para investigar a responsabilidade de quatro
políticos no superfaturamento e nas irregularidades na Arena Pernambuco,
construída pela Odebrecht:
Paulo Câmara (PSB) – governador de Pernambuco
Geraldo Júlio (PSB) – prefeito do Recife
Fernando Bezerra (PSB-PE) – senador
Tadeu Alencar (PSB-PE) – deputado federal
Todos faziam parte do comitê gestor que formatou a licitação da PPP da Arena Pernambuco, vencida pela Odebrecht.
Repasses
Investigadores suspeitam que doações da Odebrecht e da Projetec
(empresa que fiscalizava a execução da obra) a esses políticos eram
propina
Paulo Câmara: R$ 200 mil da Odebrecht em 2014
Fernando Bezerra: R$ 50 mil da Odebrecht e R$ 50 mil da Projetec em 2014
Tadeu Alencar: R$ 30 mil da Odebrecht e R$ 30 mil da Projetec em 2014
Geraldo Júlio: não recebeu doações dessas empresas
Superfaturamento
Perícias feitas na investigação apontam um superfaturamento de ao
menos R$ 42 milhões, segundo relatório da Polícia Federal. A
investigação também aponta restrição da competitividade da licitação,
com favorecimento da Odebrecht.
SupremoO procurador-geral da República, Rodrigo Janot, solicitou no último dia 3 de novembro que a investigação seja desmembrada, enviando para a Justiça Federal de Pernambuco a apuração sobre a responsabilidade de empresários da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, mantendo no Supremo o caso dos quatro políticos de Pernambuco. O caso corre sob sigilo.
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