Por Luiz Piauhylino Filho*
No início de novembro, 20 países, incluindo Estados Unidos e Canadá, se comprometeram a interromper o financiamento público de projetos de combustíveis fósseis até dezembro de 2022 e direcionar seus gastos para energia limpa. O anúncio foi feito durante a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26), realizada em Glascow, na Escócia. Na mesma reunião, o Brasil sinalizou, embora de forma não muito clara, nova meta de redução de emissões de gases do efeito estufa.
Apesar da ativista ambiental Greta Thunberg ter se referido aos discursos dos principais líderes mundiais no evento como “blá blá blá”, o fato é que, mesmo lentamente, o mundo caminha inexoravelmente para a geração de energia limpa e renovável. Trata-se de um caminho sem volta, mas o Brasil permanece indeciso, quando, na verdade, poderia ser o líder desse processo.
A Aneel deu um passo importante ao abrir a Consulta Pública nº 061/2020 para debater a normatização para usinas híbridas e associadas. Na prática, essa normatização viabilizará o uso das hidrelétricas em conjunto com usinas solares e eólicas, o que reduzirá o custo dos investimentos e o preço das tarifas para o consumidor, economizando água e diminuindo a dependência das chuvas.
No entanto, essa consulta permanece em compasso de espera há quase dois anos, sem que a agência tome uma decisão a respeito. Atualmente, quase 65% da matriz energética nacional é de hidrelétricas, que já geram uma energia limpa. Unindo a hídrica com a solar e a eólica, o Brasil poderá se tornar o país com a geração de energia mais limpa do mundo.
Mas enquanto o mundo debate o fim das usinas movidas a carvão e a combustíveis fósseis, o Brasil pretende ampliar a geração de energia com termelétricas abastecidas por óleo ou gás. Há estudos que mostram que as térmicas, em 10 anos, darão prejuízos altos. Apesar disso, a medida provisória da privatização da Eletrobrás prevê a construção de novas termelétricas para produzir 20 GW, a um custo superior a R$ 33 bilhões.
Com esses mesmos recursos, é possível instalar 8.250 MWp em usinas solares flutuantes, ou seja, um pouco mais da metade de uma Itaipu. Isso sem contar que as térmicas são pagas mesmo quando estão desligadas, o que no caso das usinas solares flutuantes não é necessário, pois o menor uso da água assegura esse bem para o consumo humano, além do reservatório poder guardá-la para uso futuro, quando houver necessidade de abastecimento ou de maior geração de energia elétrica.
O modelo hídrico-térmico, no qual o Brasil está amarrado numa camisa de força há 20 anos, é muito caro para o contribuinte. Com o preço do gás e do óleo, que abastecem as termelétricas, disparando, aumenta o preço para o consumidor, causa impacto ambiental e não gera energia suficiente para o desenvolvimento do país.
A energia gerada pelas termelétricas pode sair em média a R$ 1,5 mil o megawatt/hora, enquanto a energia solar, em leilão, é vendida a R$ 140 o megawatt/hora. O argumento contrário à geração solar e eólica de que são fontes intermitentes é frágil. Hoje há diversas soluções técnicas que derrubam esta tese vazia.
Não podemos permitir que o Brasil desfigure a sua matriz energética, que é uma das mais limpas do mundo. A hibridização das hidrelétricas exige muito menos investimento na comparação com a construção de novas usinas térmicas, reduz tarifa e pode ser instalada em apenas alguns meses. Um país, como o Brasil, com sol à vontade e um extenso parque hídrico, precisa urgentemente sair do experimental e colocar como prioridade a hibridização da sua principal fonte de energia.
*Advogado especializado no setor de energia e sócio-diretor da Sunlution