Por Walter Santos - Editor da Revista Nordeste
A primeira impressão de quem dialoga com o governador Paulo Câmara é de que ele, dentro da modernidade, projeta resultados especiais para Pernambuco. Agora, linkado com o sentido de crescimento coletivo do Consórcio gerado pelos Governadores do Nordeste, ele vai além, ao unir futuro vinculado com a essência passada de Miguel Arraes e Eduardo Campos, transbordando em João Campos. Nesta entrevista, ele fala de quase tudo e crê no amanhã. O chefe de Executivo pernambucano analisa o processo histórico e a parte dedicada ao seu Governo.
Walter Santos – O senhor conviveu, nas suas gestões, com três governos diferentes (Dilma, Temer e Bolsonaro), sempre precisando ajustar as contas para sobreviver e ainda cumprir as propostas de campanha. Como tem sido sua convivência com o Governo Bolsonaro?
Paulo Câmara – A política presume diálogo, seja com aliados ou com adversários. Sempre me pautei por essa premissa, e não tem sido diferente na relação com o atual governo federal. Estamos politicamente em lados opostos, mas é preciso ter em mente, acima de qualquer posicionamento, que fomos todos eleitos pelo povo, para trabalhar pelo povo. Então, procuro manter canais de diálogo abertos com a gestão federal, me relaciono bem com ministros, os recebo e sou recebido por eles de forma cordial, sempre buscando atender aos interesses da população de Pernambuco que me escolheu para representá-la. Não sou adepto da crítica pela crítica, mas sou de uma escola de políticos e gestores que não se calam diante das injustiças e desequilíbrios. Pernambuco é um dos 27 Estados brasileiros e, assim como os demais, merece ser tratado de forma justa e equivalente. Essa será sempre a nossa principal cobrança ao Governo Bolsonaro.
Walter Santos – Comparando às fases anteriores, como foi a etapa Dilma Rousseff e, depois, a de Michel Temer?
Paulo Câmara – Como falei antes, sempre procuro manter canais de diálogo em todos os níveis, acima de questões políticas. O governo Dilma Rousseff enfrentou muitos percalços e precisou gastar muita energia para se preservar, mas sempre que foi possível dialogar sobre os interesses do nosso Estado, nós dialogamos. Da mesma forma nos posicionamos diante do governo de Michel Temer. Politicamente, nos colocamos na oposição a ele, por decisão conjunta do meu partido, o PSB, do qual sou vice-presidente nacional. Mas esse posicionamento nunca foi obstáculo para o diálogo administrativo em favor dos melhores interesses de Pernambuco.
Walter Santos – O senhor foi reeleito em meio a muitas restrições conjunturais e financeiras. Como é governar Pernambuco sucedendo um líder do tamanho de Eduardo Campos?
Paulo Câmara – Eu atuei nos dois governos de Eduardo Campos como seu secretário, em três pastas diferentes: Administração, Fazenda e Turismo. E aprendi muito com ele, um político e gestor com visão de longo prazo, mas também com um grande bom senso ao tomar decisões imediatas. Assistir a Eduardo governar, e auxiliá-lo nessa missão, foi um imenso aprendizado. Era inegável que o futuro dele oferecia um horizonte mais amplo, nacional. Lamentavelmente, houve uma fatalidade que privou o Brasil de uma convivência maior com ele, uma convivência que prometia bons frutos para todo o País. Então, aqui em Pernambuco nós procuramos honrar a memória de Eduardo e governar com a mesma atenção e dedicação que ele mantinha, sobretudo para com os que mais precisam do Estado. Governar, e governar bem, exige entrega e sacrifício pessoal, mas a realização e a alegria de poder melhorar a vida da população de Pernambuco compensa tudo isso.
Walter Santos – Como é sua relação com a viúva Renata Campos e o filho de Eduardo, o deputado federal João Campos?
Paulo Câmara – Tenho uma relação muito respeitosa e bastante próxima com ambos. Sempre que é possível, Renata está presente aos nossos eventos, participa, se engaja e colabora com a nossa gestão. Ela é uma guerreira, uma mulher valente e de extrema dedicação aos que mais precisam. João é um jovem dinâmico e muito inteligente, que desde cedo esteve imerso na política, observando as ações do pai. Começou a se engajar ainda muito novo, como militante e depois como dirigente do PSB, e acho natural que seu caminho seja a política como meio de transformação da vida das pessoas. Tem um enorme potencial de trabalho e, sobretudo, uma visão de sociedade justa muito semelhante à que tinha Eduardo Campos.
Walter Santos – Como o senhor se auto define política e ideologicamente, nesse tempo em que crescem agrupamentos de ultra-direita no País e até em seu Estado, com pautas super conservadoras? O senhor anda satisfeito com o saldo de seu governo?
Paulo Câmara – Trabalhamos muito sob um cenário de muita adversidade, conseguimos fazer muitas ações importantes para a população e estou muito estimulado diante do que ainda podemos avançar. Nos últimos anos, Pernambuco tem crescido o dobro do índice de crescimento do País, tem recebido novos investimentos, gerando mais empregos e renda e lutando bravamente contra a crise econômica nacional. Agora, antes de mais nada, me considero um gestor responsável e comprometido com a população do meu Estado, principalmente com aqueles que mais dependem das nossas ações. Também mantenho sempre no horizonte as minhas referências políticas. Homens como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, que legaram realizações imensas ao País. E outros mais próximos a mim: Miguel Arraes e Eduardo Campos, dois exemplos de como um homem público deve atuar, voltado para os mais necessitados e, ao mesmo tempo, pensando no futuro do Estado. Sou integrante do PSB, vice-presidente nacional do partido, o único ao qual já estive filiado. O pensamento socialista moderno se baseia exatamente nesses exemplos de gestão popular que citei, de Arraes e Eduardo, e essa é a melhor forma como eu poderia me definir politicamente.
Walter Santos – Há a projeção de encontros do Fórum dos Governadores com investidores europeus e chineses. Quais são as pautas/obras fundamentais e prioritárias de seu Governo para Pernambuco?
Paulo Câmara – Acima de tudo, é preciso estar sempre atento para atrair novos investimentos para o Estado, porque essa é a melhor forma de gerar empregos e gerar renda. O Fórum de Governadores do Nordeste é um bom meio de articulação, mas para que tudo isso aconteça, é preciso antes fazer o dever de casa, como temos feito. Ter iniciativas que atraiam esses investidores, tanto europeus como asiáticos e norte-americanos, consolidando, por exemplo, os polos industriais, como vimos fazendo em Suape, no Cabo de Santo Agostinho, em Itapissuma, em Goiana, e também na interiorização de indústrias e serviços que gerem mais empregos e distribuam mais riquezas para todas as regiões do Estado. Temos investido pesado na educação, que colocou Pernambuco na liderança do ranking nacional do Ensino Médio, e também na segurança pública. Nosso bem sucedido Programa Pacto pela Vida vem reduzindo sucessivamente, há mais de 20 meses, os índices de criminalidade em todo o Estado e, recentemente, tornou-se modelo de inspiração para um programa do governo federal. Temos investido na saúde, com a reforma de hospitais e a construção de novas unidades do litoral ao sertão, na melhoria das estradas e também no social, com o reforço de programas de distribuição de renda, de profissionalização e de resgate da cidadania. Essas são as nossas pautas prioritárias.
Walter Santos – Como tem sido seu relacionamento institucional e de negócios com a China?
Paulo Câmara – Temos uma aproximação com a China, uma relação próxima com o consulado chinês e com o cônsul comercial, e isso já garantiu ao Estado duas missões, em que mandamos equipes de nossas secretarias. Uma delas foi voltada para a promoção comercial na China. Nosso time passou mais ou menos 20 dias por lá, numa imersão de conteúdo e também na área prática. Visitaram várias empresas, conheceram empreendimentos e tiveram a oportunidade de abrir o diálogo sobre negócios em várias delas. A segunda missão foi voltada para a área de empreendedorismo. O grupo também passou 20 dias e conheceu outras cidades chinesas e outros tipos de empreendimentos. A China tem um leque muito aberto de interesses relacionados com os projetos que temos a ofertar. É um lugar de dimensões continentais, então tem ali múltiplas oportunidades. Hoje, o que já estreitamos mais foram investimentos na área de infraestrutura. Também vamos ter a oportunidade do TECON 2, na área de logística. Inclusive, um grupo de trabalho está sendo criado para atuar em projetos estratégicos para o Estado e enviar uma carteira de ofertas de projetos aos chineses. Hoje, tanto a China quanto qualquer outro investidor internacional se interessa em discutir, quando se tem uma carteira de projetos pronta.
Walter Santos – Com a formação do Consórcio Nordeste, foi aberta uma linha de aproximação dos países europeus com os governos dos Estados nordestinos para fechar negócios. O que pode vir de positivo?
Paulo Câmara – Isso se tornou um horizonte mais próximo. Abrimos, por exemplo, uma conversa com a AFD, a Agência Francesa de Desenvolvimento, e ela tem aportes para investimentos públicos, investimentos privados e investimentos que venham através de parcerias público-privadas. Eles têm recursos. Estamos montando uma carteira de projetos para conversar com eles, o que deve acontecer mais ou menos em 20 dias. Também vamos ter um evento em Natal, o EBA, que é o Encontro Brasil-Alemanha, voltado mais para negócios na área das indústrias. Vamos ter uma participação nesse evento e a oportunidade de conversar com empresas alemãs que tenham interesse em investir aqui no Brasil. Com uma carteira de projetos bem estruturada, e mantendo um bom diálogo, tenho certeza de que vamos avançar.
Walter Santos – O Brasil vive uma fase de recessão e alta do desemprego. Como o senhor tem se virado para manter a máquina com saúde fiscal e produzindo obras e serviços?
Paulo Câmara – Quando assumi, desde o meu primeiro mandato, sabia que não seria fácil, que iria encarar muitos desafios na gestão, com um país imerso nessa crise econômica sem precedentes. Mas a minha longa experiência como auxiliar nos governos de Eduardo Campos, e a minha sólida formação como servidor público, me garantiram equilíbrio e visão necessários para enfrentar tudo com a cabeça erguida e com disposição de trabalho. Começamos por fazer um dos maiores ajustes fiscais já realizados no País, cortando na própria carne, reduzindo despesas de custeio e enxugando o orçamento para honrar compromissos públicos, como o pagamento em dia dos servidores, do 13º salário, compromissos que vários Estados brasileiros, por conta da crise, terminaram não conseguindo honrar. Mas precisávamos que sobrassem recursos para investimentos na melhoria dos serviços prestados aos cidadãos. E conseguimos, com muito esforço, investir numa política de segurança pública que hoje é vista como exemplo por muitos governantes, numa política educacional e de saúde igualmente bem sucedidas. Tudo isso foi conquistado com muito trabalho, com muito diálogo e com muito engajamento da nossa equipe e da própria população.
Walter Santos – A educação tem sido um ponto importante no seu governo. Qual a fórmula de manter investimentos mesmo com o governo federal reduzindo repasses nessa área?
Paulo Câmara – Na verdade, não existe uma fórmula pronta. Existe trabalho, dedicação e diálogo. Pernambuco criou e implementou, de forma pioneira no Brasil, o formato das escolas integrais, com atendimento mais amplo e de qualidade ao aluno. E isso virou modelo nacional. Agora, estamos iniciando o Criança Alfabetizada, um programa de investimentos no ensino básico - em princípio, de responsabilidade dos municípios - firmando parcerias com todas as 184 prefeituras de Pernambuco, que se engajaram com entusiasmo na nossa proposta. Vamos, juntos, remodelar o ensino básico e torná-lo ainda mais atrativo para os estudantes, combatendo a evasão escolar e garantindo, num futuro próximo, que todas as crianças de Pernambuco sejam alfabetizadas, e alfabetizadas com qualidade, com nível de excelência. Da mesma forma como chegamos ao topo do ranking do ensino médio no Brasil, queremos atingir o mais alto nível também no ensino básico. Educação é o único caminho para o futuro de Pernambuco e do Brasil, e não podemos pensar pequeno nessa área.
Walter Santos – Até o final de dezembro, qual a principal prioridade da gestão?
Paulo Câmara – Não há uma, mas várias prioridades. Diria que é prioritário garantir o funcionamento e os avanços nas áreas que citei, da educação, da saúde e da segurança, mas também do desenvolvimento econômico, dos investimentos. A cada mês que fechamos, avaliamos os índices e constatamos o crescimento positivo. Mas se virmos que algo não correu a contento, chegamos junto, reforçamos a área e cobramos resultados. Foi para isso que a população nos colocou aqui.
Walter Santos – O senhor vai participar da eleição municipal juntamente com o prefeito Geraldo Julio, no Recife. O que o senhor acha de João Campos para a disputa?
Paulo Câmara – Primeiramente, é bom ressaltar que, como governador, minha missão prioritária é dar continuidade à gestão no Estado. Essa é uma obrigação da qual não abro mão. É claro que 2020 está próximo, mas ainda estamos em 2019, e não há um cenário eleitoral definido. Há tendências, indicações, mas é muito cedo para falar em nomes. Não só para a disputa no Recife, mas em todo o Estado, as conversas ainda estão acontecendo. No período adequado, pretendo circular por todos os municípios onde tivermos candidatos aliados à Frente Popular, levando o meu apoio. Quanto a João Campos, como já falei antes, é um jovem brilhante e de futuro político promissor. Mas não sou eu, nem ele, quem decide o candidato. Quem indica o nome é o partido, e o PSB é bastante unido nesse sentido. No momento oportuno, avaliaremos o potencial dos nossos quadros e decidiremos em conjunto. Afinal, como dizia Miguel Arraes, não basta querer ser candidato, é preciso se viabilizar como candidato.
Walter Santos – Em meio a todas as revelações do The Intercept contra diversos personagens da Lava Jato, o que o senhor defende para Lula e seus algozes, Sérgio Moro e Deltan Dallagnol?
Paulo Câmara – Justiça. Isso é sempre fundamental. O julgamento e a condenação do ex-presidente Lula foram muito rápidos, por isso levantaram questionamentos de uma parte da sociedade, ao ponto de o Supremo Tribunal Federal, por iniciativa do ministro Edson Fachin, chegar a discutir uma eventual revisão dos autos do processo. Quanto ao ministro Sérgio Moro e ao procurador Deltan Dallagnol, cabe aos seus pares e ao Poder Judiciário analisarem o trabalho feito na Lava Jato e as decisões tomadas por eles. As denúncias obtidas a partir das gravações divulgadas pelo The Intercept precisam, também elas, ser apuradas com cuidado e equilíbrio. Essa é uma missão do Judiciário. Assim como todo cidadão realmente interessado no esclarecimento definitivo dos fatos, vamos acompanhar o desenrolar desse processo.