por Luiz Carlos Azenha, no Viomundo
Se você falar num “três em um” numa
rodinha de jovens muitos vão fazer cara de paisagem. É o mesmo que falar
em óleo de fígado de bacalhau, DKV ou Olivetti.
Em 1989 ter um “três em um” em casa
era símbolo de status. Especialmente aqueles que vinham acompanhados de
grandes caixas de som. Vitrola, toca-fitas e rádio, tudo num mesmo
aparelho!
Eu morava, então, em Nova York. Era correspondente da TV Manchete.
Testemunhei um momento histórico,
via satélite. A Globo colocou ao vivo o sinal do debate presidencial
entre Lula e Fernando Collor para ser visto na cidade. Se não me engano,
foi num restaurante da rua 46, então a rua dos brasileiros em
Manhattan, hoje tomada por comerciantes coreanos.
Durante o debate, Collor “acusou”
Lula de um pecado imperdoável para um operário “igualzinho a você” — era
o slogan utilizado pela campanha de Lula: ter um “três em um”
sofisticado.
O simbolismo era inescapável: o
dirigente sindical teria dirigido as grandes greves do ABC em busca de
vantagens pessoais. Era um aproveitador. Nos bastidores, dizia-se também
que Lula tinha abandonado a cachaça e aderido ao uísque importado, como
se isso fosse um crime lesa Pátria.
Na época, ninguém perguntou se
Collor também tinha “três em um” em casa. Logo ele, filhinho de papai da
oligarquia alagoana! Era o máximo da desfaçatez.
Lembrei-me do episódio ao receber, por e-mail, os links de várias reportagens de O Globo e da Folha sobre o triplex do Lula no Guarujá.
O ex-presidente declarou pagamentos
feitos à cooperativa responsável pelo imóvel em 2006. Disse ao imposto
de renda ter pago R$ 47.695,38 até então. O valor total foi quitado em
2010.
Em nota, o instituto Lula falou em “suposto apartamento”,
já que o ex-presidente nunca ocupou o imóvel e nem assumiu oficialmente
a propriedade. Esclareceu que a primeira dama Marisa Letícia comprou
uma cota do prédio em 2005, da Bancoop, paga em prestações. O casal não
decidiu ainda se fica com o imóvel.
Para turbinar a notícia, a Folha cita
corretores não identificados que avaliaram o apartamento em R$ 1,5
milhão. Minha sugestão é que o Otavinho compre o imóvel por este preço.
Dinheiro certamente não é problema para o dono da Folha. Nem para os bilionários irmãos Marinho, tão interessados no caso.
Independentemente da “avaliação” da Folha estar
ou não correta, é óbvio que o imóvel é compatível com a renda de um
presidente que cumpriu oito anos de mandato, pagou em prestações e hoje
viaja o mundo dando palestras.
A questão aqui é outra: por que
sabemos tudo sobre o apartamento de Lula e absolutamente nada sobre os
imóveis de Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin e Aécio Neves? Em
nome de quem está o apartamento que Aécio ocupa em Belo Horizonte, por
exemplo? FHC tem mesmo um apartamento na avenue Foch, em Paris?
A explicação é simples e repetitiva: dois pesos, duas medidas.
Vinte e cinco anos depois, com a perspectiva de Lula se candidatar em 2018, o “três em um” se tornou “triplex”.
É bala na agulha para enredar o
ex-presidente com uma das acusadas na Operação Lava Jato, a empreiteira
OAS, que concluiu as obras do edifício no Guarujá.
O ex-presidente deve estar acostumado.
Em 1989, na reta final da campanha, a
ex-namorada de Lula, Miriam Cordeiro, apareceu no Jornal Nacional e na
campanha de TV de Fernando Collor acusando Lula de ter sugerido a ela
que abortasse a filha Lurian, além de falar mal dos negros.
O jornal O Globo chegou a produzir um editorial justificando a baixaria, intitulado O Direito de Saber. Trecho:
Até que anteontem à noite surgiu nas telas, no horário do PRN, a figura da ex-mulher de Lula, Miriam Cordeiro, acusando o candidato de ter tentado induzi-la a abortar uma criança filha de ambos, para isso oferecendo-lhe dinheiro, e também de alimentar preconceitos contra a raça negra.
A primeira reação do público terá sido de choque, a segunda é a discussão do direito de trazer-se a público o que, quase por toda parte, se classificava imediatamente de ‘baixaria’.
É chocante mesmo, lamentável que o confronto desça a esse nível, mas nem por isso deve-se deixar de perguntar se é verdadeiro. E se for verdadeiro, cabe indagar se o eleitor deve ou não receber um testemunho que concorre para aprofundar o seu conhecimento sobre aquela personalidade que lhe pede o voto para eleger-se Presidente da República, o mais alto posto da Nação.
Que ironia!
As mesmas Organizações Globo nunca
acreditaram que o eleitor brasileiro tinha o direito de saber que
Fernando Henrique Cardoso teve um caso com uma repórter da emissora,
ANTES de ser candidato pela primeira vez ao Planalto.
Do caso teria nascido uma criança.
Ambos, mãe e filho, viveram “exilados” na Europa, uma notícia que só foi dada pela revista Caros Amigos no ano 2000! O filho, revelou muito mais tarde um exame de DNA, afinal não era, mas sempre foi tratado como herdeiro.
O brasileiro nunca teve — e
provavelmente jamais terá — o direito de saber deste logro histórico!
Pelo menos não nas páginas dos jornalões e nos telejornais da Globo.
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