Por Miguel do Rosário, no Tijolaço
A entrevista com Kakay, um dos
maiores advogados criminalistas do país, traz uma crítica dura à maneira
como a mídia tenta manipular a opinião pública, tentando pressionar
juízes, e transformando mentiras em verdades.
Ele critica também os juízes que participam desse jogo sujo da mídia, em especial Joaquim Barbosa, herói da Globo.
Ao analisar o julgamento do
mensalão, Kakay diz que Barbosa, ao “admitir que colocou as penas altas
para fugir da prescrição”, tornou-se um “caso de impeachment”.
Felizmente, talvez temendo um movimento desse tipo, pediu para sair antes.
*
Do Jornal GGN.
“O falso pode se tornar verdadeiro pela repetição na imprensa como um todo”
SAB, 28/03/2015 – 12:12
Jornal GGN – Quem disse isso, que
“aquilo que é falso pode se tornar verdadeiro pela repetição na imprensa
como um todo” foi o advogado criminalista Antonio Carlos Almeida
Castro, conhecido por Kakay, que sempre teve muito espaço na mídia,
justamente por seus clientes. E ainda ganha. Advogado de Duda Mendonça
no julgamento do mensalão, Kakay é o responsável por sua absolvição. E
desde o começo de março, Kakay foi contratado por Aécio Neves, para
acompanhar os desdobramentos da segunda fase da Operação Lava Jato. O
PGR pediu o arquivamento do processo contra Aécio. Kakay continua na
área.
Mas ele é o advogado que joga muito
bem com a mídia, nunca em causa própria, sempre em nome deste ou daquele
interesse de seu representado. E é na condição de advogado com larga
experiência no trato com o Supremo Tribunal Federal que ele deu mais
esta entrevista, desta vez à Gazeta do Povo, analisando a atual
situação, que é única no que diz respeito à tensão. Leia a entrevista a
seguir.
“Eu advogo no STF há 33 anos e nunca vi uma situação tão tensa no Supremo”
Antonio Carlos de Almeida Castro (Kakay), advogado criminalista
Paulo Ferracioli, especial para a Gazeta do Povo
Ficha técnica:
Natural de : Patos de Minas (MG)
Currículo : graduado em direito pela Universidade de Brasília (UnB). Advogado criminalista.
Leu recentemente : A morte de Ivan Ilitch, de Leon Tolstoi ; O livro do desassossego, de Fernando Pessoa
Juristas que admira : Nelson Hungria, Sepúlveda Pertence, Luís Roberto Barroso
Nas horas vagas : lê, bebe vinho e faz academia e pilates
Curiosidade : é sócio de dois restaurantes em Brasília
Famoso por defender figuras de
renome da política nacional, o advogado Antonio Carlos de Almeida
Castro, mais conhecido como Kakay, não hesita em criticar a atuação do
Supremo Tribunal Federal (STF) durante o julgamento do caso do mensalão.
Segundo ele, a ação penal 470 teve resultados desastrosos para a
jurisprudência brasileira. A atuação do ministro Joaquim Barbosa como
presidente do STF também foi objeto de repúdio pelo advogado
criminalista. Durante sua passagem por Curitiba para a V Conferência
Estadual dos Advogados, Kakay concedeu entrevista ao Justiça &
Direito, na qual analisou sua relação com a imprensa e ainda criticou
institutos de direito processual penal.
Qual balanço é possível fazer da ação penal 470, o caso mensalão?
Houve a espetacularização do
resultado, uma tentativa de o Supremo Tribunal Federal (STF) atender à
voz das ruas, o que é uma coisa indefinida. Houve um atraso na
jurisprudência, o ministro Joaquim Barbosa chegou a admitir que colocou
as penas altas para fugir da prescrição, o que é um caso de impeachment.
Criou-se uma falsa impressão de que o Poder Judiciário brasileiro
mudou. Mas quem faz o Judiciário brasileiro são os juízes das comarcas
mais distantes, que trabalham sem condições mínimas de trabalho, são os
desembargadores, que têm milhares de processos. É muita petulância desse
cidadão achar que aquele processo mudou o país. Nada disso. A mensagem
passada foi muito ruim. Na época, ele virou o relator, o presidente e o
carcereiro. A mensagem que se passa para o promotor da comarca distante é
muito ruim. Um ministro do Supremo não tem de estar preocupado em ser
aplaudido em um bar. Tinha de estar preocupado em ser respeitado pela
jurisprudência que ele vai fazer. Esse processo trouxe muitos
malefícios, foi ruim para a jurisprudência porque retirou vários
direitos garantistas e constitucionais que custamos a consolidar. Criou
uma impressão de insegurança para o cidadão que é lúcido. Imagine estar
sentado em casa vendo televisão e ver uma briga do Joaquim Barbosa com
os outros ministros. O cara pensa: “meu Deus do céu, isso aí que é o
STF?” O Judiciário como um todo precisa ter uma certa austeridade.
Com a presidência do ministro Ricardo Lewandowski, o senhor espera mudanças no STF?
Sem sombra de dúvida. O Lewandowski
tem uma tradição de lanheza no trato com as pessoas, com a advocacia,
com o Ministério Público e com os próprios pares. Acho que vai haver uma
mudança significativa. A toga era maior que o Joaquim, e ele não
suportou esse peso. Apequenou o STF através de sua atitude arbitrária e
sempre muito agressiva, tanto com jornalistas quanto com os pares.
Chegou a dizer que o plenário do STF tinha feito uma chicana. Eu advogo
no STF há 33 anos e nunca vi uma situação tão tensa no Supremo. O
natural agora é que volte a uma normalidade. O Joaquim era muito
inseguro. O STF tem de ser uma casa aberta como sempre foi, os ministros
sempre recebem. Quando o Joaquim assumiu no STF, eu fui levar a ele um
memorial e um parecer do então advogado e hoje ministro Luís Roberto
Barroso. O Joaquim me disse: “eu recebo seu memorial, Kakay, e vou lê-lo
com prazer, mas o parecer não precisa nem deixar comigo porque eu não
leio, porque eu acho que pareceristas são todos vendidos”. Eu falei:
“mas, Joaquim, isso aqui é um parecer do professor Barroso”. E ele:
“não, quem faz parecer é para ganhar dinheiro”. Ele tinha essa pequenez.
Acho que é um momento muito bom para o Supremo, é muito interessante
que um homem do porte do Lewandowski venha a assumir.
O senhor tem uma boa relação com a imprensa. A classe jurídica presta a devida atenção a isso?
É importante você fazer o
contraponto em nome do seu cliente. Eu não falo com a imprensa porque
quero falar. Eu estou sempre falando em nome de uma tese ou de uma
proposta do meu cliente. Se você deixa num processo que está na mídia
que só ocorra a versão da acusação, você cria uma dificuldade no futuro
para o seu cliente. Procuro ter [um bom relacionamento com a imprensa],
dentro do princípio de que o contraponto é necessário. Eu gasto um tempo
enorme, mas faço com prazer. Primeiro, porque estou defendendo uma
ideia, que serve para a advocacia como um todo. Eu, que atuo em casos
que têm furor midiático, acho que você tem que mostrar o outro lado.
Aquilo que é falso pode se tornar verdadeiro pela repetição na imprensa
como um todo. Quando meu cliente fala que quer contratar um assessor de
imprensa porque está muito rumoroso o caso, eu respondo que o melhor
assessor de imprensa é aquele que te tira da mídia. Quando o processo
sai da mídia, ele passa a ter um embate que aí me interessa, que é o
embate técnico. Quando ele está na mídia, há uma certa deturpação que
não interessa a ninguém. Eu costumo dizer que as pessoas se portam como
se estivessem em um jogo de máscaras. Prefiro que o meu cliente esteja
em um processo fora da imprensa e, de preferência, fora do foro único do
Supremo Tribunal Federal.
O senhor atua em casos pro bono?
Se eu sou procurado, há uma tese que
me impressiona e a pessoa não pode me pagar, eu aceito. Meu escritório é
muito pequeno, somos em cinco advogados. Eu atuo basicamente em
tribunais superiores e em processo penal. Às vezes eu me sensibilizo com
a pessoa e, para cobrar uma quantia menor, eu prefiro trabalhar pro
bono. Esses casos eu não divulgo e ninguém fica sabendo. Aquele caso do
ano passado, em que abriram um inquérito contra manifestantes, me
procuraram e eu advoguei para eles.
Como foi seu início da carreira?
O fato de eu trabalhar em Brasília
fez com que eu tivesse um tipo específico de cliente. Em Brasília ficam
os tribunais superiores, e governadores, senadores e deputados têm o
foro em Brasília. Já advoguei para mais de 60 governadores. É difícil
alguém que não seja de Brasília que tivesse essa oportunidade. Eu brinco
que, como só tive cliente inocente até hoje, meu índice de ganho é
muito grande. Quem melhor indica um caso para você é outro cliente. Eu
tenho escritório pequeno, trabalho de forma artesanal. Tudo do
escritório passa por mim, discuto todos os casos, a sustentação oral sou
eu que faço.
O que poderia ser aprimorado no processo penal brasileiro?
Hoje nós temos dois institutos que
são muito mal usados. Na minha visão, a prisão temporária é para
investigar e não vejo fundo constitucional nela. A prisão deve ser a
ultima ratio, só pode haver prisão quando tiver culpa formada, salvo
casos excepcionalíssimos. O outro é a condução coercitiva. Não tem
previsão legal, a condução coercitiva só pode ser feita se você é
intimado a ir a uma delegacia e se nega a ir, já que o Estado pode te
obrigar porque o cidadão é obrigado a prestar os esclarecimentos. Mas a
primeira medida não pode ser coercitiva. Fazem isso porque querem
espetacularizar, para em casos conhecidos a imprensa ficar sabendo.
Recentemente, tive um caso em Brasília que eu só fiquei sabendo na noite
anterior porque a imprensa me ligou. No outro dia, às 5 horas da manhã a
TV Globo estava em cima da casa dele. São medidas que, do meu ponto de
vista, não têm amparo constitucional.
O senhor considera que a polícia brasileira é preparada?
No geral, é sim. Nós temos alguns
exageros, como o caso do tira hermeneuta. Como os procedimentos são
muito longos e quase todos se baseiam em escutas telefônicas, nós temos
essa figura catastrófica da pessoa que fica ouvindo os depoimentos por
um ou dois meses e depois faz uma interpretação. Só que só se leva para
os autos aquilo que o tira hermeneuta achou importante. Teria de ser
disponibilizado tudo o que foi ouvido, para que eu possa dizer o que é
importante. Se você fala algo em uma entonação de voz, a intepretação é
uma. Temos uma polícia técnica boa, a Polícia Federal trabalha muito
bem, mas esse tempo excessivo ao longo dos processos leva a erros e nós
advogados ganhamos dos erros processuais, seja do Ministério Público ou
da polícia. Felizmente o STJ e o STF têm uma visão mais garantista, e
isso joga o cidadão contra os tribunais superiores. Existem abusos
feitos pelos juízes e, quando o tribunal muda, parece que o tribunal é
leniente.
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