Clovis Rossi – Folha de S.Paulo
Entendo
perfeitamente as suspeitas implícitas no pedido do delegado federal
Marcio Adriano Anselmo para que sejam exaustivamente investigadas as
causas do que ele chama de acidente entre aspas com Teori Zavascki.
Inimigo número 1 das teorias da conspiração, sou obrigado a convir que, neste caso, há abundantes motivos para alimentá-las. A ver:
1
– Sérgio Machado é pescado no telefone implorando a Romero Jucá para
trabalhar pelo impeachment de Dilma. Seria, para Machado, a única
maneira de "estancar a sangria" que a Lava Jato estava provocando e
ainda iria provocar.
2 – O impeachment veio, mas a "sangria" não foi estancada.
3
– Agora, procuradores federais têm informação absolutamente seguras de
que a, digamos, "operação estanca-sangria" continua viva e operante.
4
– O ministro Teori Zavascki era o relator da Lava Jato no Supremo, a
única pessoa habilitada, neste momento, a "estancar a sangria".
5
– No telefonema de Machado a Jucá, os interlocutores "reconheceram a
impossibilidade de cooptar o ministro", no relato do sempre brilhante
Bernardo Mello Franco na sexta-feira, 20.
6 – Aí, cai uma avioneta e Zavascki morre.
Morre
com ele a Lava Jato? Não necessariamente, porque parte considerável do
trabalho está feita, já havia sido entregue, mas cópias de A a Z estão
com a Procuradoria.
É um trabalho insano: foram 940 depoimentos dos 77 executivos da Odebrecht que entraram no esquema de delação premiada.
Procuradores e policiais federais formaram 122 equipes de mais de 200 pessoas para montar o dossiê.
Se
prevalecesse a opinião do procurador-geral Rodrigo Janot, Zavascki
deveria levantar o sigilo dos depoimentos. No mínimo, evitaria
vazamentos parciais e/ou interessados - e os interesses são formidáveis
quando se sabe que os nomes de políticos citados são de um ecumenismo
extraordinário.
É
razoável supor que o ministro agora morto tivesse aproveitado as férias
para adiantar o trabalho de analisar a pilha de informações e, com
isso, dar andamento mais rápido aos processos. Como é um trabalho de
equipe, é igualmente razoável supor que o pessoal de Zavascki tenha
avançado o suficiente para impedir que a morte entorpeça demais os
procedimentos.
Mas
aí entram as perguntas de cunho muito mais político que
judicial-administrativo-burocrático: para começar, o substituto de
Teori, seja quem for, terá idêntica disposição de trabalhar em conjunto
com o Ministério Público e com a força-tarefa da Lava Jato?
Terá
coragem para peitar a substancial fatia do mundo político sob suspeita?
Terá suficiente isenção para degolar, se e quando for o caso, à
direita, à esquerda e ao centro? Por tudo isso, é fundamental que não
paire a menor dúvida sobre as causas do acidente.
É
simplesmente assustador pensar que permaneça na cabeça do público a
hipótese de que se tentou estancar a sangria à custa do sangue do
ministro.
O Brasil cairia no esgoto.
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