Sites e emissoras de TV noticiaram, em tempo real, cada minuto do voo
que partiu de São Paulo, passou por Belo Horizonte, até chegar a
Brasília, levando os nove condenados na Ação Penal 470, o processo do
mensalão; gasto do poder público com a viagem não foi baixo: em empresas
privadas, a viagem de jato de São Paulo a Brasília custaria cerca de R$
30 mil; para quê tamanho gasto, uma vez que não há a necessidade de os
presos estarem fisicamente próximos à Vara de Execução que determina
como será o cumprimento da pena?; Lei de Execução deixa claro que o
preso deve ficar em local “próximo a seu meio social e familiar”;
provavelmente todos os que foram levados a Brasília no espetáculo
midiático do último sábado serão entregues de volta a seus locais de
residência.
Marcos de Vasconcellos, do Consultor Jurídico
- Os brasileiros viram neste sábado (16), pelos jornais e televisão,
nove condenados na Ação Penal 470, o processo do mensalão, serem levados
por jato da Polícia Federal para Brasília. José Dirceu e José Ganoíno
voaram de São Paulo para Belo Horizonte, onde embarcaram na aeronave
outros sete réus no processo em direção à capital do país. O gasto do
poder público com a viagem não foi baixo: em empresas privadas, a viagem
de jato de São Paulo a Brasília custaria cerca de R$ 30 mil.
Discute-se, porém, o motivo de tamanho gasto, uma vez que não há a
necessidade de os presos estarem fisicamente próximos à Vara de Execução
que determina como será o cumprimento da pena. Além disso, a Lei de
Execução deixa claro que o preso deve ficar em local “próximo a seu meio
social e familiar”.
Normalmente, independente de onde foi cometido o crime, o condenado
cumpre pena onde reside e tem família. Isso por conta do caráter
ressocializador da prisão, explica o criminalista Marcelo Feller. O
processo de execução é que acompanha o condenado, e não o condenado que
acompanha a execução. “Se a pessoa é condenada no Amazonas, mas é presa
em São Paulo para cumprimento de pena, a Justiça amazonense encaminha
para São Paulo os autos da execução criminal, onde o juiz das execuções
paulista vai ser o competente para analisar os pedidos e procedimentos
da execução”, exemplifica Feller.
O mais provável de acontecer é que todos os que foram levados a Brasília
no espetáculo midiático do último sábado sejam entregues de volta a
seus locais de residência — não se sabe se de jato, de avião de carreira
ou de ônibus —, para que cumpram a pena conforme determina a lei. “Esse
avião da Policia Federal representa um gasto alto e deve ser usado para
fins essenciais às funções dela”, afirma o advogado Pedro Ivo Cordeiro,
do Almeida Castro Advogados Associados. A banca atuou no processo
representando os publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes, que
foram absolvidos.
Mesmo com seus clientes absolvidos, o escritório acompanha de perto o
caso. O sócio Antônio Carlos Almeida Castro, o Kakay, também ataca a
ponte aérea: “Nada justifica a operação caríssima, salvo essa
necessidade quase mórbida de espetacularizar as prisões. É uma espécie
de pena acessória, a humilhação dos condenados, paga com dinheiro
público para promoção pessoal de algumas autoridades”.
Isso porque não há necessidade de os condenados comparecerem à Vara de
Execução para que o local de cumprimento das penas seja determinado,
explica o criminalista Pierpaolo Bottini, do Bottini e Tamasauskas
Advogados. “A logística é inédita”, diz ele, mas faz questão de lembrar
que muita coisa é ou será novidade, já que é a primeira vez que o
Supremo encerra um processo criminal com tantos réus condenados.
Marcelo Feller também classifica como “inovadora e inexplicável” a
decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou que o juiz das
execuções de Brasília será o responsável pela execução dos condenados, e
todas as suas decisões deverão ser encaminhadas diretamente ao relator
da Ação Penal, ministro Joaquim Barbosa, que poderá ratificá-las ou
modificá-las. “Isso é, com todo o respeito, medonho”, reclama.
Outra questão que tem gerado debate é o fato de aqueles condenados a
cumprir pena em regime semi-aberto terem voado para Brasília e sido
encaminhados ao Complexo da Papuda enquanto esperam a decisão da Vara de
Execuções. Ou seja, mesmo condenados ao regime semi-aberto, foram
transferidos do local onde têm convívio social, familiar e de onde
trabalham para cumprir pena, na prática, em regime fechado, enquanto
esperam a decisão da Justiça, pois não terão autorização para deixar o
presídio enquanto não forem transferidos de volta às suas regiões, onde
poderão comprovar estarem empregados.
O presidente do Movimento de Defesa da Advocacia, Marcelo Knopfelmacher,
lembra que não se pode admitir o cumprimento de pena em regime mais
severo daquele estipulado na sentença se o Estado, por ineficiência e
descaso, não provê os meios necessários para tanto.
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