Texto do jornalista Ricardo Kotscho
Se cobrir, vira circo; se cercar, vira hospício. A velha expressão
popular nunca foi tão adequada para explicar o que aconteceu na noite de
quarta-feira na Câmara, com o picadeiro do toma-lá-dá-cá armado durante
a votação do pacote fiscal do governo, um festival de traições
generalizadas, fisiologia explícita, agressões físicas e palhaçadas a
cargo da "trupe de choque" uniformizada do deputado Paulinho da Força
Sindical.
Só que ali ninguém rasga dinheiro. A moeda de troca - a oficial, pelo
menos - são os cargos federais que estão sendo rateados pelo
coordenador político do governo, o vice Michel Temer, na longa batalha
pela aprovação da medida provisória 665, primeira parte do ajuste fiscal
que muda a concessão de direitos trabalhistas e previdenciários.
Ao final, o governo venceu. Foi uma vitória sofrida, por um placar
bastante apertado (252 a 227), mas pelo menos afastou-se o perigo
iminente da ingovernabilidade, caso o pacote do ministro da Fazenda,
Joaquim Levy, fosse rejeitado.
O placar demonstrou não só a divisão do plenário da Câmara, mas
também o clima de barata voa reinante nos partidos. Aliados votaram
contra o governo ou se ausentaram, enquanto oposicionistas ferozes
votaram a favor do pacote fiscal.
Para se ter uma ideia da zorra reinante na votação, vamos aos números.
Embora a bancada tenha fechado questão, nove deputados do PT, o
partido da presidente, não compareceram à sessão e um votou contra. No
PMDB, o principal partido aliado, 13 deputados do total de 64 votaram
contra o governo. Quer dizer, os dois principais partidos do governo,
que passaram a semana se estranhando, quase empataram no número de
traições.
O campeão foi o PDT do ministro do Trabalho, Manoel Dias, em que toda
a bancada de 19 deputados votou contra a medida provisória. No PP,
foram 18 traições, quase metade da bancada de 39 e, no PTB, exatamente a
metade (12 dos 24).
Em compensação, 8 dos 22 deputados do DEM de Ronaldo Caiado, o mais
radical partido oposicionista, votaram a favor do governo. O curioso é
que o PSDB, que sempre defendeu as medidas neoliberais adotadas pelo
ministro Levy, foi o único da oposição que votou em bloco contra o
pacote fiscal, "em defesa dos direitos dos trabalhadores", a grande
bandeira histórica do PT.
Teve de tudo, até chuva de dinheiro lançada pela Força Sindical sobre
o plenário, com cédulas de "petrodólares", que traziam fotos de Dilma e
Lula. As excelências se divertiram e, no final do espetáculo, até
promoveram um panelaço, em mais um capítulo deprimente rumo à
desmoralização do Congresso Nacional.
No meio da baixaria, reapareceu a figura do deputado suplente Roberto
Freire, dono do PPS, ex-candidato a presidente da República, que partiu
para cima da deputada Jandira Feghalli, do PC do B, durante uma
discussão com Alberto Fraga (DEM-DF), um expoente da "bancada da bala".
Inconformada, a deputada reagiu em seu Facebook e prometeu recorrer à
Justiça. Trecho do seu relato:
"Parece que as noites da Câmara não têm como piorar nesta
Legislatura. Sim, fui agredida fisicamente pelo deputado Roberto Freire
durante discussão da medida provisória 665 agora há pouco. Pegou meu
braço com força e o jogou para trás. O deputado Aberto Fraga, não
satisfeito com a violência flagrada, disse que "quem bate como homem
deve apanhar como homem", vindo na minha direção. Fazia menção a mim. É
assustador o que esta acontecendo nesta Casa (...) Vou acionar
judicialmente o senhor Fraga pela apologia inaceitável".
E assim vamos que vamos. Para onde?
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