247 - Setores
conservadores da sociedade brasileira, descrentes de sua capacidade de
chegar ao poder pelas vias convencionais, teriam um plano: promover a
"aventura catastrofista" da Copa do Mundo de 2014, no Brasil. A tese é
levantada pelo jornalista Gabriel Priolli, um dos mais consagrados
profissionais da televisão brasileira.
"Dias atrás, na primeira vez em que
externei essa preocupação, recebi o previsível fogo de barragem.
Disseram que é paranóia minha, exagero. Que as convicções democráticas
da oposição e de sua mídia são inquestionáveis. E que a eleição
transcorrerá dentro das regras, sem tentativas de tapetão", disse ele.
"Será mesmo? O pré-golpe de 1964, em que muitos não acreditavam que a
legalidade fosse demolida, talvez nos ensine melhor sobre os métodos do
conservadorismo para tomar o poder".
Coincidência ou não, a edição da
Folha deste domingo destaca uma coluna com o mote "Não vai ter Copa",
dos que pretendem tumultuar o País durante o Mundial de 2014 (leia mais aqui).
Um repeteco de junho de 2013 em 2014, durante os jogos, parece ser a
esperança de setores da sociedade para promover uma mudança na agenda
política do País.
Abaixo, o texto de Gabriel Priolli:
A Jogada da Copa
Por Gabriel Priolli, do blog A Priolli
Seis meses depois dos protestos que
tomaram inúmeras cidades brasileiras, decantadas as insatisfações
apresentadas pelos manifestantes e as múltiplas soluções aventadas por
todos os atores políticos para a estranha crise que se formou, temos um
quadro bem claro. A maioria da população quer mudanças no
país, mas prefere que elas sejam conduzidas por Dilma e não pela
oposição. A presidenta lidera em todas as sondagens de intenção de voto.
Falta muito tempo até as eleições,
certamente, e já assistimos a oscilações espetaculares de intenção de
voto nos pleitos anteriores, inclusive candidaturas que “atropelaram” na
reta final e venceram. Tudo pode acontecer, portanto, até que se
proclamem os resultados. Mas, até segunda ordem, quem lidera é Dilma. A
soma dos votos de seus adversários não supera os votos da candidata
governista e tudo indica que a eleição será definida já no primeiro
turno.
Sim, mas há um outro roteiro
possível para este ano. Nele, as massas sairiam novamente às ruas em
junho, em plena Copa do Mundo, e causariam tal transtorno à competição
que seria impossível ignorá-las. A mídia mundial distribuiria a todo o
globo imagens de multidões pedindo reformas, de black blocs destruindo
seus alvos habituais e das polícias reprimindo com a cortesia conhecida.
As cenas passariam a impressão de um
país sem governo e de um governo sem legitimidade – impressões
absolutamente falsas. Mas o que é mesmo a verdade, nessas coisas da
mídia e da enunciação de seus conteúdos?
Um governo “ilegítimo”, pressionado
externamente, ficaria acuado também pelos adversários internos. Estes
amplificariam ao máximo possível os protestos e tentariam conduzir a sua
pauta, exatamente como fizeram em 2013. Para criar um clima de
megacrise, que nenhum ponto de contato tem com o real. Mas o que é
exatamente o real, quando se tem o controle do que a mídia diz sobre
ele?
Quem sabe se, em meio ao eventual
fiasco da Copa – corre-corre e pancadaria nas imediações dos estádios,
os inevitáveis problemas organizativos amplificados ao extremo, as
queixas e angústias dos turistas constrangidos pelo clima de guerra
política no Brasil e, prêmio final, uma boa derrota da seleção nacional
-, os eleitores não embarquem na ideia de jogar toda a culpa em Dilma?
Quem sabe não escolham na urna uma alternativa de oposição?
Acumulam-se as evidências de que
setores conservadores, descrentes de sua capacidade de sedução do
eleitorado pelas vias convencionais, cogitam se lançar na aventura
catastrofista da Copa. Pretendem que o maior evento já realizado no país
fracasse espetacularmente, para o máximo constrangimento e desgaste do
governo atual. Acham que colherão os louros dessa ação de lesa-pátria.
É simplesmente doentia a ideia de
que, para conquistar o poder de “consertar” o país, alguém considere
aceitável que a nossa imagem internacional seja destruída. Que o Brasil
seja penalizado por décadas, pela “incapacidade” de realizar grandes
eventos internacionais. E que isso aconteça fundamentado em mentira e
manipulação da opinião pública.
Mas, infelizmente, a possibilidade é
bastante concreta. Daqui até junho, provavelmente veremos novas
convocatórias para que as massas voltem às ruas e façam manifestações
“espontâneas”. Assistiremos à incitação explícita de atos destinados à
desestabilização do governo. “Não vai ter Copa!”, bradarão outra vez os
carbonários – com todas as câmeras e microfones à sua disposição.
Dias atrás, na primeira vez em que
externei essa preocupação, recebi o previsível fogo de barragem.
Disseram que é paranóia minha, exagero. Que as convicções democráticas
da oposição e de sua mídia são inquestionáveis. E que a eleição
transcorrerá dentro das regras, sem tentativas de tapetão.
Será mesmo? O pré-golpe de 1964, em
que muitos não acreditavam que a legalidade fosse demolida, talvez nos
ensine melhor sobre os métodos do conservadorismo para tomar o poder. E
sobre como ele é campeão em destruir a democracia, para “salvá-la” da
ameaça dos governos populares.
Por que deveríamos confiar agora em quem não foi confiável no passado e segue não sendo?
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