Bernardo Mello Franco - Folha de S.Paulo
É
dura a vida dos deputados que ousam desafiar a onipotência de Eduardo
Cunha. Além de terem o microfone cortado quando contestam seus desmandos
em plenário, eles sabem que as vitórias são raras e duram pouco. Se
perde uma votação à tarde, o peemedebista passa a noite em negociações
para virar a mesa no dia seguinte.
Nesta
quinta-feira, os independentes da Câmara mostraram que também andam sem
sorte. Eles recorreram ao Supremo Tribunal Federal para anular a
manobra que aprovou a redução da maioridade penal. Entre os 11
integrantes da corte, o sorteado para relatar o caso foi o ministro
Gilmar Mendes.
"Vou
comprar um pacote de sal grosso para espalhar no gabinete", murmurou um
deputado petista. O mandado de segurança contra a manobra de Cunha foi
assinado por 102 parlamentares de 14 partidos, incluindo dissidentes do
PMDB.
Ex-assessor
de Collor e FHC, Mendes tem exibido sintonia fina com o presidente da
Câmara. Em fevereiro, foi o único ministro do Supremo a participar do
jantar que selou a aprovação da PEC da Bengala, na residência oficial de
Cunha. Há um ano e três meses, impede o julgamento que poderia proibir o
financiamento empresarial das campanhas.
Mendes
travou o processo com um pedido de vista, quando a maioria dos colegas
já havia votado a favor da proibição das doações privadas. Ele antecipou
que é contrário à ação, mas se recusa a devolvê-la, em desrespeito às
normas do STF. Enquanto segura a causa, Cunha ganha tempo para incluir
as contribuições empresariais na Constituição.
Pressionado,
o ministro disse que entregaria seu voto até o fim de junho. O mês
terminou, e a corte entrou em férias sem que ele cumprisse a palavra. Em
entrevista recente, Mendes afirmou que "não houve combinação" com Cunha
para retardar o julgamento. A declaração parece tão verdadeira quanto a
sua promessa de devolver o processo.
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