247 - O
jurista Dalmo Dallari, um dos mais respeitados do País, rebateu o
parecer de Ives Gandra Martins, encomendado por um advogado ligado ao
Instituto Fernando Henrique Cardoso, sobre o impeachment da presidente
Dilma Rousseff. Dallari concedeu entrevista à assessoria do deputado
Paulo Teixeira (PT-SP), que pode ser lida abaixo:
Em entrevista concedida de Paris,
por telefone, à assessoria de comunicação do mandato do deputado federal
Paulo Teixeira, realizada na tarde desta sexta-feira (6/2), o jurista
Dalmo Dallari acusou o também jurista Ives Gandra de elaborar um parecer “absolutamente
inconsistente” sugerindo a existência de elementos para a abertura de
um processo de impeachment da presidenta Dilma. “Eu não vejo a mínima
consistência nessa tentativa de criar uma base jurídica para o
impeachment”, afirmou.
Professor emérito da Faculdade de
Direito da USP e especialista em Direito do Estado, Dallari chamou de
absurda a aplicação da doutrina do domínio do fato no caso Petrobras e
lembrou que, se fossem seguir a lógica sugerida por Ives Gandra, o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deveria perder seus direitos
políticos e todos os senadores do país poderiam ser igualmente cassados.
“A Constituição, no artigo 52, dá como atribuição do Senado ‘processar e
julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de
responsabilidade’”, disse. “Portanto, se ele considera que, mesmo sem
comprovação de conhecimento direto, existe a obrigação de agir, então
essa obrigação existe para os senadores também.”
Na hipótese de parlamentares de
oposição levarem adiante um pedido de impeachment, Dallari sugere
recorrer ao Supremo Tribunal Federal com um mandato de segurança. “Uma
ação visando cassar direitos sem haver nenhuma fundamentação é
claramente inconstitucional”, cravou.
O sr. tomou conhecimento do
parecer divulgado pelo Dr. Ives Gandra Martins? Concorda que há base
jurídica para pedir o impeachment de Dilma?
Esse parecer do Dr. Ives Gandra é
absolutamente inconsistente. Ele cita uma porção de artigos e leis, mas
não cita um único fato que demonstre a responsabilidade da presidente
Dilma. O que ele está fazendo é uma aplicação da chamada doutrina do
conhecimento do fato, ou domínio do fato, e que é absolutamente absurda,
não é juridicamente aceitável. Ele de fato não fez a mínima
demonstração, nem por via direta ou indireta, de que a presidente
tivesse conhecimento do que ocorria de irregular dentro da Petrobras, de
maneira que eu não vejo a mínima consistência nessa tentativa de criar
uma base jurídica para o impeachment. Aliás, posso acrescentar um dado
interessante. Se a base for simplesmente esta, se a obrigação de zelar
pela probidade administrativa for suficiente para a cassação de um
mandato, então deveriam, pela mesma lógica, ser cassados os mandatos de
todos os senadores.
Por quê?
Porque a Constituição, no artigo 52,
dá como atribuição do Senado “processar e julgar o Presidente e o
Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade”. Portanto,
se ele considera que, mesmo sem comprovação de conhecimento direto,
existe a obrigação de agir, então essa obrigação existe para os
senadores também. Coerentemente, ele deveria propor a cassação do
mandato de todos os senadores por crime de responsabilidade, o que é
evidente absurdo. Há um jogo evidentemente político tentando criar uma
aparente fundamentação jurídica que, de fato, não existe. É pura
tentativa de criar uma aparência de legalidade quando o que existe é um
objetivo político, nada mais.
Depoimentos recentes na
delação premiada indicaram que os desvios datam de 1997 e teriam chegado
ao auge em 2000. Se isso se comprovar, poderia resvalar de alguma forma
no ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
É curioso que acaba de ser publicada
no jornal francês Le Monde uma matéria a respeito da empresa francesa
Alstom, que atua no metrô brasileiro, e que, segundo o jornal, já em
1998 praticava corrupção no Brasil. Em 1998, o presidente era o Fernando
Henrique Cardoso. Então (pela mesma lógica) ele deveria perder
os direitos políticos. Ele deve ser considerado conivente. Foi omisso,
permitiu que uma empresa estrangeira praticasse corrupção no Brasil.
Isso mostra, também, o absurdo dessa tentativa de criar uma imagem de
responsabilidade jurídica quando não há de fato nenhum fundamento para
essa responsabilização.
O sr. está acompanhando o processo da Petrobras de Paris? Que avaliação o sr. faz dos encaminhamentos recentes?
Estou acompanhando. Verifiquei um
dado muito interessante, num artigo do Janio de Freitas, que vai
frontalmente contra as afirmações do parecer do Ives Gandra, quando ele
diz que a presidente destruiu a Petrobras. Uma compilação de dados de
agora mostra que, em 2014, a Petrobras obteve proveitos excepcionais.
Ela cresceu muito. Não houve essa destruição que é expressamente
referida no parecer de Ives Gandra. É mais um elemento para demonstrar
que essa argumentação é inconsistente. Isso apenas revela uma tentativa
de políticos inconformados porque perderam a eleição e não conseguem
retornar ao poder. No caso do Ives Gandra, ele pura e simplesmente
recebeu para fazer um parecer dizendo isso. Toda a carreira dele é no
sentido de uma posição de estrema direita, ultraconservadora, de maneira
que tudo isso faz com que seu parecer não tenha nenhuma importância
jurídica.
Numa especulação rasteira,
se a oposição levar adiante qualquer tipo de proposta de impeachment,
como o sr. acha que vai se dar o debate?
Acho que caberia um mandato de
segurança, uma ação no Supremo Tribunal Federal bloqueando essa
iniciativa por absoluta falta de fundamento jurídico. Aí, sim, o
cabimento é tranqüilo, direto, indiscutível. Uma ação do Parlamento
visando cassar direitos sem haver nenhuma fundamentação é claramente
inconstitucional. Então caberia um mandato de segurança para a sustação
de um projeto nesse sentido.
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