André Singer
O último destempero de Joaquim Barbosa, ao agredir de maneira ofensiva o
ministro Ricardo Lewandowski em sessão sobre a ação penal 470 na última
quinta-feira, pode vir a consolidar um diagnóstico (negativo) a
respeito da personalidade pública do atual presidente do Supremo
Tribunal Federal.
Se, como relator, ele já havia apresentado indícios de intolerância e
autoritarismo, o uso do poder conferido pela presidência (rotativa) da
Casa para tentar fazer calar com insultos um par que dele discordava
denotou falta de capacidade institucional.
Não se trata, no caso, do mérito da questão em debate. É possível até
que Barbosa estivesse certo quanto ao conteúdo, fiando-me na análise que
Marcelo Coelho publicou ontem nesta Folha. Em resumo,
Lewandowski teria de fato, como argumentava Barbosa, colocado em dúvida
algo que já havia sido discutido e deliberado pelos juízes em 2012.
Lewandowski, porém, encontra-se no direito, e talvez até no dever, de
apresentar as dúvidas que julgar pertinentes. O papel da presidência é,
sobretudo, o de garantir que as regras do jogo sejam respeitadas, isto
é, que cada membro do tribunal exerça plenamente o papel que lhe cabe.
Se o coordenador da sessão, em lugar de atuar como magistrado, isto é,
aquele que arbitra com equilíbrio, resolve adotar um dos lados, o
sentido de justiça fica prejudicado.
É evidente que em assun- to de tamanho significado político, ou seja,
relevante para o destino do conjunto da sociedade, não será um momento
de descontrole que irá comprometer longo trabalho de investigação,
reflexão jurídica e debates. Não serão também características psi-
cológicas de determinado indivíduo que irão, espera-se, impedir um
resultado final mais equilibrado.
O problema é que, com a entrada no STF de Luís Roberto Barroso e Teori
Zavascki, a linha preferida por Barbosa --a das penas exemplares e do
furor punitivo-- poderá ter oposição reforçada. Nessas circunstâncias, a
cólera demonstrada pelo relator anteontem vai encontrar diversas
oportunidades de se manifestar.
Seja como for, a legitimidade de Barbosa está bamba. Em situação
anterior, tendo insultado um jornalista de maneira intempestiva e
gratuita, pediu desculpas por meio da assessoria de imprensa. Agora,
precisaria retratar-se em plenário, diante do colega ofendido, de
maneira clara e convincente.
Diz-se de pessoa de pavio curto que tem personalidade mercurial,
viajando rapidamente, como o deus romano, em direção a inesperadas
explosões de raiva. Vejamos como Mercúrio vai reagir nos próximos dias à
pressão causada pelos próprios erros.(FOLHA DE SÃO PAULO
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