247 - A defesa do ex-presidente Lula
divulgou uma nota em que rebate o editorial divulgado pelo jornal O
Estado de S. Paulo nesta terça-feira 28. No texto, o jornal da família
Mesquita diz que a condenação de Lula "é certa", uma vez que "sobram
provas contra ele".
Para a defesa, trata-se de "curandeirismo jurídico" do
jornal, que não apresenta "qualquer argumento jurídico para sustentar
sua posição e a tese que pretende reforçar junto aos leitores. A
realidade é bem diversa daquela exposta pelo jornal".
A nota acusa ainda a mídia de "acumpliciamento" com o juiz
Sergio Moro, pelo fato de o editorial "confundir a combatividade de
nossa atuação" com "tentativas de irritar o magistrado". O jornal pede a
condenação de Lula por medo de que ele vença as próximas eleições
presidenciais.
Leia a íntegra da nota dos advogados:
Nota
A pretexto de analisar a visão política de um dos membros do
Partido dos Trabalhadores (PT) em entrevista concedida ao Valor, o
jornal O Estado de S.Paulo volta a praticar curandeirismo jurídico em
seu editorial de hoje (28/02) para sustentar que "se os processos contra
Lula forem analisados somente no âmbito jurídico, a derrota do petista é
certa". O próprio jornal, no entanto, não apresentou qualquer argumento
jurídico para sustentar sua posição e a tese que pretende reforçar
junto aos leitores. A realidade é bem diversa daquela exposta pelo
jornal.
Em uma das ações penais que o Ministério Público Federal
promoveu contra Lula, valendo-se do espalhafatoso e indigno uso de um
Powerpoint que chocou a comunidade jurídica nacional e internacional,
sustentou-se que o ex-Presidente teria organizado um esquema que
possibilitou o desvio de valores de três contratos firmados entre a
Petrobras e uma empreiteira, e o produto desse ilícito teria sido
utilizado para a "compra de governabilidade" (daí o aumento da base
parlamentar em seu governo) e resultado em benefícios pessoais (a
propriedade de um apartamento "tríplex" no Guarujá, SP, e o pagamento da
armazenagem de parte do acervo presidencial.
As 65 testemunhas ouvidas, até o momento, nessa ação - sendo
27 selecionadas pelo Ministério Público Federal - quebraram a espinha
dorsal da acusação. Nenhuma, inclusive os notórios delatores da Lava
Jato, fez qualquer afirmação que pudesse vincular Lula a qualquer desvio
na Petrobras, à propriedade do triplex ou ainda a recursos utilizados
para a armazenagem do acervo presidencial. Ao contrário, os depoimentos
apontaram a colossal distância entre esses supostos ilícitos na
petroleira – que não foram identificados, diga-se de passagem, por
qualquer órgão de controle interno ou externo – e o ex-Presidente Lula.
Foi nessa mesma ação penal que o ex-Presidente Fernando
Henrique Cardoso, ao ser confrontado com a prática de ilícitos na
Petrobras no período em que era o dirigente máximo do País, com o
envolvimento de alguns dos mesmos atores que hoje figuram na Lava Jato,
reconheceu que "o Presidente da República não tem como saber de tudo".
FHC também esclareceu que mantém seu acervo presidencial através de
doações, exatamente como fez Lula.
Tamanha é a segurança na inocência de nosso cliente que
pedimos - também nessa ação - a realização de uma prova pericial que
pudesse analisar, dentre outras coisas, se algum valor desviado da
Petrobras foi utilizado em benefício do ex-Presidente Lula. Mas a prova
foi negada pelo juiz sem maior fundamentação. E por quê? Simplesmente,
porque iria demonstrar, de uma vez por todas, que nenhum valor
proveniente da Petrobras foi usado para beneficiar Lula. Outras provas
requeridas também foram negadas da mesma forma.
Quem acompanha o que acontece na 13ª Vara Federal de
Curitiba - presencialmente ou pelas gravações realizadas - sabe a
distância entre o que afirma O Estado de S.Paulo e a condução real das
audiências pelo magistrado responsável pelos processos. São
rotineiramente desrespeitadas expressas disposições legais, como aquelas
que asseguram às partes o direito de gravar as audiências independente
de autorização judicial. A OAB/PR já aderiu à nossa impugnação sobre o
tema e deu prazo para o magistrado se explicar.
O jornal confunde a combatividade de nossa atuação – que
deveria nortear a conduta de qualquer advogado - com tentativas de
"irritar o magistrado", deixando evidente a falta de seriedade de sua
análise e a conivência do diário com as ilegalidades praticadas naquele
órgão judiciário.
Aliás, esse acumpliciamento entre o juízo e alguns setores
da imprensa está longe de ser novidade. Quando o principal ramal do
nosso escritório foi interceptado, gravando a conversa de 30 advogados, o
jornal ficou absolutamente silente, a despeito de violação flagrante às
nossas prerrogativas. Bem diferente foi a posição quando se buscou
quebrar o sigilo de jornalistas, o que mostra o casuísmo presente nas
análises.
Os abusos praticados contra Lula pelo juiz da 13ª Vara
Federal de Curitiba não são denunciados apenas por nós, seus advogados.
No último dia 26.02, por exemplo, o próprio O Estado de S.Paulo veiculou
entrevista com Nelson Jobim, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e
com atuação nas mais diversas áreas do governo, afirmando que a
condução coercitiva de Lula foi arbitrária. Ele também lembrou outros
atentados jurídicos praticados contra o ex-Presidente pelo mesmo juiz.
Aliás, foi esse cenário de flagrantes arbitrariedades e
ilegalidades, que afrontam claramente as garantias fundamentais de Lula,
associado à ausência de um remédio eficaz para paralisá-las, que
motivou o Comunicado de junho de 2016 ao Comitê de Direitos Humanos da
ONU, que assinamos juntamente Geoffrey Roberston, um dos maiores
especialistas no mundo sobre o tema. Em momento algum deixamos de
apresentar, com técnica jurídica, a defesa em favor de Lula.
A propósito, não só elaboramos consistentes trabalhos
jurídicos de defesa, como tornamos publico esse material (site
www.averdadedelula.com.br). Oportuno lembrar, ainda, que o Congresso
Nacional reconheceu em 2009 a possibilidade de qualquer brasileiro levar
um comunicado ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, de forma que a
providência tem expresso amparo na legislação nacional. Os erros já
cometidos pelo jornal no acompanhamento da tramitação do comunicado em
Genebra também são a prova cabal da clara e deliberada confusão entre a
opinião do diário e a apuração jornalística. A segunda está a reboque da
primeira.
Das demais ações penais propostas contra Lula nesse assédio
de alguns membros do MPF, com o cristalino objetivo de prejudicar ou
inviabilizar sua atividade política, existe uma em estágio mais
avançado, que tramita perante a 10ª Vara Federal de Brasília. Essa ação
penal trata da – absurda – "compra do silêncio de Nestor Cerveró" e está
baseada exclusivamente em acusação feita pelo senador cassado Delcídio
do Amaral em delação premiada negociada com o MPF, que permitiu que ele
deixasse a prisão. A ação foi proposta sem que Cerveró sequer tivesse
sido ouvido sobre essa acusação de Delcídio, mostrando que a apuração ou
a verdade dos fatos não foram os nortes seguidos pelos acusadores.
Também os depoimentos ali colhidos mostram o óbvio: Lula jamais
participou de qualquer ato objetivando interferir, direta ou
indiretamente, na delação de Nestor Cerveró. O próprio delator deixou
claro esse fato quando foi ouvido em juízo, na mesma linha seguida pelas
demais testemunhas.
Esse balanço é suficiente para mostrar as impropriedades
cometidas pelo jornal, em seu editorial de hoje, sob o disfarce de uma
análise jurídica para a qual sequer dispõe de expertise e isenção para
realizar. Sintomática igualmente a afirmação ali contida de que "sobram
provas" contra Lula, mas nenhuma foi apontada, exatamente porque não
existem! São apenas fruto de construções grosseiras, que O Estado de
S.Paulo insiste em reverberar, com a divulgação constante de erros
factuais em sua pretensa cobertura jornalística "isenta".
Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins
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