segunda-feira, 24 de setembro de 2018

O “bode” no bolso

POR FERNANDO BRITO · no TIJOLAÇO



Ontem, escrevi aqui sobre “o bode do bode”, o sentimento que começa a atingir parte da classe média em sua insana adesão a Jair Bolsonaro. Hoje, na Folha, Celso Rocha de Barros, mostra o mesmo, sob a ótica econômica, em texto que vale a pena ser lido e difundido, ao qual acrescento a charge do Benett a que ele se refere.

Celso Rocha de Barros, na Folha

Chegou a hora de saber se você, que se divertiu com todo o lado “politicamente incorreto” de Bolsonaro, está disposto a perder dinheiro para continuar ouvindo a piada.

Na semana passada, Paulo Guedes, guru econômico de Bolsonaro, apresentou a um grupo de empresários sua proposta para reformar os impostos brasileiros. Não era para os empresários terem contado para ninguém (o que é meio suspeito), mas a Folha descobriu a história.

Causou escândalo a proposta de criação de uma nova CPMF, que o tuiteiro @oobservadorbr chamou de “Imposto Ipiranga”. Bolsonaro desautorizou Guedes e negou que vá criar o Imposto Ipiranga.

Mas Bolsonaro defendeu outra proposta de Guedes, a mudança no Imposto de Renda.

E aqui tem um negócio que talvez tenha passado despercebido para os bolsonaristas.

Guedes defende uma alíquota de imposto de renda igual para todo mundo que não for isento: 20%. Sozinho, esse número já sugere que os ricos se deram bem nessa (atualmente pagam 27%). Em entrevista ao O Estado de S. Paulo, o economista Sergio Gobetti estimou que a proposta deve beneficiar os 11% mais ricos do Brasil.

Esse é o segmento em que Bolsonaro vai melhor nas pesquisas: os mais ricos e boa parte do que costumamos chamar de “classe média”. Inclui os oficiais do exército, por exemplo.

Ora, então os bolsonaristas mais entusiasmados vão lucrar com a proposta de seu candidato, certo?
Depende se ele é rico.

O economista Carlos Góes, do site Mercado Popular, notou algo que não recebeu muita atenção. A proposta de alíquota única elimina as isenções para saúde e educação (entre outras) que são usadas sobretudo pelo pessoal da classe média para cima.

Não sou especialista, talvez isso seja uma boa ideia.

Mas garanto que não é o que esperam os bolsonaristas mais entusiasmados. Muito menos os oficiais do Exército.

Se eu entendi direito, na proposta de Guedes, eles pagarão mais imposto de renda, a não ser que sejam tão ricos que essas isenções de saúde e educação não façam muita diferença.

Mas será que os bolsonaristas que perderiam a capacidade de pagar escola particular e plano de saúde não poderiam se salvar recorrendo aos serviços públicos?

Aí o problema é outro: Guedes não tem ideia do que vai fazer para o governo não quebrar.

Em sabatina na Globonews, Guedes defendeu zerar o déficit público em um ano, com um trilhão de reais que conseguiria vendendo todas as estatais e todos os terrenos do governo federal.

Esse número redondo, como vocês já devem ter imaginado, foi produzido pelo International Institute of Tirei um Número da Cueca Aqui Agora.

Nos cálculos da economista Zeina Latiff, o valor da participação do governo nas estatais é bem menor, cerca de 140 bilhões. E não, não dá para vender todas as estatais em um ano, isso é coisa de cracudo desesperado por pedra.

E os terrenos da União incluem os que têm prédios do governo em cima. Já avisaram os militares que, se depender do Guedes, eles vão ficar sem teto e vão pagar mais impostos? Os caras vão acabar votando no Boulos.

E isso tudo é porque ainda nem começamos a discutir o que Bolsonaro pretende fazer com os pobres. O general vai pagar mais imposto, mas a mãe do soldado, essa sim está ferrada se Bolsonaro vencer.

PS: certa mesmo estava a charge do Benett na última quinta-feira.

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