Folha de S. Paulo – Vinícius Torres Freire
A
gente se horroriza de ver tantas pessoas largadas na degradação da
miséria nas ruas do centro rico da cidade mais rica do Brasil, São
Paulo. Não raro remexem o lixo à procura de comida ou de latas que lhes
renderão centavos. Dormem nas calçadas geladas. Não lembrava de ver
tantos faz bem mais de uma década.
Não
devem ser as cenas mais lúgubres do país. Os três anos de recessão
desgraçaram mais a vida de uma região bem mais pobre, o Nordeste, do que
pouco se fala.
Desde
que a ruína começou, no início de 2014, o número de pessoas com algum
tipo de trabalho diminuiu em cerca de 2,3 milhões no Brasil inteiro.
Quase 69% dessa baixa de empregos ocorreu no Nordeste. Note-se que a
região contava apenas com 24,5% da população ocupada em 2014. É
desproporcional ao ponto da calamidade.
Do
total dos rendimentos perdidos no país desde 2014, 46,5% se foram no
Nordeste, que, no entanto, tinha apenas cerca de 16,6% da massa nacional
de rendimentos do trabalho (contas baseadas na Pnad Contínua do IBGE).
Os resultados do Nordeste continuam ruins se a comparação é feita com os
dados de 2015 ou 2016, mesmo que a região acompanhe a despiora nacional
recente.
Pelas
contas do Boletim Regional do Banco Central, o PIB do Nordeste
estagnava ainda em fevereiro (dado mais recente), quando o restante do
país crescia, na comparação trimestral. As vendas no varejo encolhiam,
no trimestre, subindo na média do país. A inflação é maior no Nordeste.
A
queda dos PIBs das maiores economias da região, Bahia, Pernambuco e
Ceará, foi da ordem de 5% em 2016, ante 3,6% da média nacional.
Essa
tristeza acontece de resto em Estados em que os rendimentos do trabalho
equivalem, em geral, à metade da média daqueles de São Paulo, a cerca
de R$ 1.400 por mês (a disparidade deve ser ainda maior, se considerados
os rendimentos do capital, em geral subdeclarados).
No
caso de quem faz bico, a situação é ainda pior. No Nordeste, a
informalidade afeta quase 50% dos empregados (quem trabalha sem
carteira, por conta própria e com a família, sem salário). No Sudeste,
33%.
A
crise foi mais destrutiva em Pernambuco, onde se registrou a maior
baixa nacional na massa de rendimentos do trabalho: perda de 17% em
relação a 2014 (no Brasil, de 2,5%). Em seguida, nos próximos Alagoas e
Sergipe, com perdas em torno de 9%. Depois, Bahia e Ceará, quase 6%,
desgraça semelhante à do Rio de Janeiro. Paraíba, Rio Grande do Norte e
Maranhão ficaram no azul ou quase.
Que
praga se abateu sobre o Nordeste? Aqui é possível dar apenas pinceladas
cinzas e grossas, pois se trata de quatro anos, de nove Estados, e os
estudos são escassos.
Houve
cinco anos de seca, que abateu muito o Ceará. Houve o colapso de preços
e produção de derivados de petróleo, que abalou a Bahia. A interrupção
do desastroso projeto da refinaria Abreu e Lima e o colapso da indústria
naval derrubaram Pernambuco, que ainda perdeu com a baixa produção de
energia elétrica (seca) e de automóveis. A ruína da Petrobras e do
investimento federal em obras, enfim, contribuíram para o desarranjo
nordestino.
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