Especialista em matemática eleitoral, o professor e ex-secretário estadual de Administração, Maurício Romão,
declarou hoje (21) estar convencido de que o TSE determinará a
realização de uma nova eleição em Água Preta, caso receba recurso neste
sentido.
Semana passada, por 4 votos contra 2, o TRE a vitória do prefeito
Eduardo Coutinho (PSB), que obteve apenas 47,25% dos votos válidos, ante
52,75% de Armando Souto (PDT). Leia, abaixo, as considerações do
professor Maurício Romão:
A novela da eleição para prefeito de Água Preta em 2012 tem dois
capítulos: no primeiro, o candidato Armando Souto disputa o pleito sub
judice, ganha, mas o registro de sua candidatura foi indeferido pelo TSE
e os votos recebidos por ele foram anulados. O segundo colocado,
Eduardo Coutinho, foi empossado como prefeito. Capítulo encerrado.
No segundo capítulo, Souto entra com recurso pleiteando nova
eleição, já que obteve mais da metade dos votos válidos e, em princípio,
pela legislação em vigor, quando isso acontece, outro pleito é
convocado. O TRE, contudo, em julgamento no dia 16 do corrente, por quatro votos a dois, decidiu por não realizar nova eleição em Água Preta. Capítulo em andamento: cabe recurso ao TSE.
Desvendando os dados
Na publicação dos resultados da eleição de 2012 para prefeito de
Água Preta o TRE mostra somente a votação obtida por Eduardo Coutinho
(7.776 votos) e por Tibério de Dito (74 votos). Mas na página
“Resultados dos candidatos com votação anulada”, sabe-se que Armando
Souto teve 8.764 votos.
Ainda no site do TRE descobre-se que o total de votos nulos da
eleição foi de 9.559. Subtraindo-se daí os votos anulados de Armando
Souto, depreende-se que foram computados 795 votos nulos originais,
aqueles decorrentes de manifestação de vontade eleitoral, de erro
involuntário ou deliberado.
Como os votos em branco somaram 285 e os votos apurados
totalizaram 17.694, segue-se que foram 16.614 os votos válidos
originais. Dividindo-se a votação de Armando pelos votos válidos
originais tem-se 52,75%.
Fundamento legal
Nestas circunstâncias, a legislação determina nova eleição, pois
mais da metade dos votos válidos foi conferida a candidato cuja votação
foi anulada pelo TSE. O art. 224 do Código Eleitoral expressa essa
determinação, in verbis:
“Se a nulidade atingir mais de metade dos votos…
julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia
para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias”.
A recente Resolução nº 23.372 do TSE, de 14/12/2011, que dá os
contornos reguladores da eleição de 2012, enfatiza o que dispõe o art.
224 do Código Eleitoral, quando, no seu art. 164, item III, situa
precisamente o ocorrido no pleito de Água Preta, verbatim:
“Se a nulidade dos votos dados a candidatos com registro
indeferido for superior a 50% da votação válida e se já houver decisão
do Tribunal Superior Eleitoral indeferitória do pedido de registro,
deverão ser realizadas novas eleições imediatamente…”
Votos apurados = votos válidos
Segundo nota do TRE, do dia 16/01, divulgada logo após o
julgamento do Pleno, a maioria dos desembargadores eleitorais do órgão
“…ratificou o entendimento do Ministério Público Eleitoral, ao
considerar como válida a totalidade de votos, incluindo brancos e
nulos.”
Isso significa dizer que a Corte considerou os votos apurados
iguais aos votos válidos. Em outras palavras, os votos originais em
branco (285) e os votos originais nulos (795) foram descartados.
Com essa deliberação, os votos válidos do pleito aumentam para
17.694. Agora, a votação de Armando Souto dividida por esses votos
válidos ampliados representa apenas 49,53%, isto é, menos da metade do
total. Portanto, não se preenche o requisito ditado pelo art. 224, retro
mencionado, para a ocorrência de nova eleição.
Votos em branco e votos nulos
Estas duas modalidades de voto (branco e nulo), contudo, são manifestações de vontade eleitoral e independentes dos votos anuláveis! São votos decorrentes de protesto, erro de digitação, indiferença, desinteresse, indefinição, etc.
Igualar os votos válidos aos votos apurados é desconsiderar tais
manifestações próprias de ato exclusivo do eleitor. É como se na eleição
nenhum eleitor tivesse tido o direito de se posicionar diferentemente
daqueles que sufragaram voto em uma das candidaturas postas.
Ou, sob outro prisma, é como todos os eleitores que compareceram
ao pleito fossem obrigados a votar nos postulantes ao cargo, não lhes
sendo facultado o exercício de sua soberania decisória.
Note-se, ademais, que a votação de Armando Souto, considerada
nula, não necessita dos votos originariamente nulos para atingir mais da
metade dos votos válidos e, portanto, suscitar nova eleição. Quer dizer
não viola o disposto na Resolução TSE nº 22.992/2008, verbatim:
“Os votos dados a candidatos cujos registros
encontravam-se sub judice, tendo sido confirmados como nulos, não se
somam, para fins de novas eleições (art. 224, CE), aos votos nulos
decorrentes de manifestação apolítica do eleitor”.
Se os votos originariamente nulos se somassem aos votos anulados
de Armando Souto o percentual total de votos anulados do pleito seria
maior ainda, claro, atingindo 57,54% dos votos válidos.
Mas o próprio TSE (Agravo Regimental nº 665, Acórdão relatado
pelo ministro Arnaldo Versiani*) se posiciona objetivamente sobre quais
votos devam ser levados em conta para efeito de nova eleição, in verbis:
“Para fins do art. 224 do Código Eleitoral, a validade da votação ou o número de votos válidos na eleição majoritária não é aferida sobre o total de votos apurados,
mas leva em consideração tão somente o percentual de votos dados aos
candidatos desse pleito, excluindo-se, portanto, os votos nulos e os
brancos, por expressa disposição do art. 77, § 2º, da Constituição
Federal” (Grifo nosso, MCR).
Então, resta meridianamente claro que para o ensejo de nova
eleição (art. 224) o número de votos válidos é o somatório da votação
dos candidatos (8.764 + 7.776 + 74 = 16.614, no caso de Água Preta),
excluídos os votos nulos e os brancos.
Em outro trecho desse mesmo Acórdão, é enfatizado que a validade
da votação deve levar em conta apenas os votos consignados aos
candidatos, ipsis litteris:
“Não se somam aos votos nulos derivados da manifestação
apolítica dos eleitores aqueles nulos em decorrência do indeferimento do
registro de candidatos; afigura-se recomendável que a
validade da votação seja aferida tendo em conta apenas os votos
atribuídos efetivamente a candidatos e não sobre o total de votos
apurados” (Grifo nosso, MCR).
Então, visto assim de longe, sem acesso aos pareceres e votos de
suas excelências, pode-se antecipar, data maxima venia, que a decisão do
TRE não será respaldada pelo TSE.
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