O anúncio de que os beneficiários do Bolsa Família não terão reajuste este ano foi mais um sinal de como o governo Bolsonaro vê o sistema de seguridade social. A inflação de quase 5% não será repassada aos beneficiários do programa. O congelamento basicamente anula os efeitos da concessão do 13º do Bolsa Família divulgado pelo governo, pois, na realidade com essa medida 60% do 13º virá da redução da correção dos valores atuais. Ou seja, um arrocho para as pessoas que mais precisam.
A decisão de cancelar o aumento real do salário mínimo é outra medida que pune as pessoas mais pobres, as que têm no salário mínimo a única fonte de sobrevivência. Para estes, o governo anunciou que os valores serão corrigidos apenas pela inflação, acabando com a política que garantia aumento com ganho real.
Os salários no Brasil, mesmo com a política de aumentos reais dos últimos 10 anos, continuam no fim da fila quando se fala valor. Pesquisa do Instituto de Economia e Ciências Sociais da Alemanha de 2018, envolvendo 37 países de todos os continentes (entres eles os ricos como Estados Unidos, Inglaterra, França, Canada, Alemanha, Portugal, Holanda e países de dimensão econômica bem menor que Brasil como Lituânia, Romênia, Albânia, Sérvia e Argentina), mostra que o Brasil ocupa a posição número 34 do ranking, ficando à frente apenas da Rússia, Ucrânia e Moldávia.
A política de reajuste real do salário mínimo nos últimos 10 anos possibilitou o crescimento anual em 1,7% acima da inflação, em média, fazendo o valor chegar aos atuais R$ 998, equivalente a U$ 260, o que é muito pouco quando se compara com vizinhos como a Argentina, e distante anos-luz quando o parâmetro são os países detentores do mesmo nível de riqueza que o Brasil. Comparando com a Argentina, o poder de compra do salário do Brasil é de US$ 1,26 a hora, enquanto no nosso vizinho é de US$ 2,53, duas vezes o nosso. Se a comparação for com os oito ricos, temos um abismo. O salário médio naqueles países fica em torno US$ 8 dólares a hora.
As alterações representam aperto nos 30 milhões de beneficiários do INSS, mais 13 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família, que também serão penalizadas sem reajuste neste ano, e outros 45 milhões de trabalhadores em atividade. É uma decisão, portanto, que caminha no sentido de aumentar ainda mais a concentração de renda e resultado financeiro pífio, representando economia em torno de R$ 7,5 bilhões no próximo ano.
A redução do salário mínimo e o congelamento do Bolsa Família representam economia para o governo equivalente a apenas 7 dias de gastos com os juros da dívida pública, dívida religiosamente paga ao sistema financeiro. Se a comparação for com a fortuna de 58 bilionários brasileiros, detentores de R$ 720 bilhões em patrimônio, a despesa do reajuste para mais de 50 milhões pessoas (INSS e Bolsa Família) representam 1% desse patrimônio, riqueza que não tem imposto sobre grandes fortunas. Bilionários que têm ainda o poder de utilizar artifícios fiscais que diminuem sensivelmente o imposto pago, enquanto que quem ganha salário mínimo paga imposto sem poder de arbitragem seja federal, estadual ou municipal.
A decisão do governo é um retrocesso. As medidas atingem quase 100 milhões de pobres arrochando benefícios sociais e o salário mínimo, o que é um contrassenso. Enquanto isso, nada tem sido cobrado dos mais ricos. Estes, desde o início do governo, assistem aos ataques aos que menos têm sem serem importunados. Ou seja, a fatia dos 10% da população que fica com mais de 60% de toda a riqueza permanece imune à cruzada do governo de ataque aos pobres e aos direitos sociais.
De FRANCISCO ALEXANDRE
Ex-diretor da Previ e ex-presidente da BRF Previdência
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