segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

ARTIGO: LUIZ REI GONZAGA

Luiz Rei Gonzaga
Angelim, década de 60. Escola Azarias Salgado. Um palco. Uma sanfona branca. Uma zabumba. Um triângulo. Ali, fui com minha mãe Luzinete Salgado (meu pai, Deoclécio Cavalcanti, ficou em casa cuidando dos meus irmãos) e pela primeira vez vi e ouvi de perto o Rei do Baião que, até então, só ouvia num velho rádio ou numa vitrola (aparelho de som para tocar discos de vinil) lá de casa.
Ele foi anunciado num eco que toda a cidade se fez ouvir: Luizzzzzzzzzzz Gonzagaaaaaaaaaaaa. De repente ele surgiu trajando gibão branco e um chapéu de couro colorido. O povo aplaudia e gritava. Ele abriu aquela sanfona branca como se quisesse abraçar cada um que ali se encontrava. Deu um grande grito dizendo "Vaiiiiiiiiiii boiadeiro que a noite já vem, guarde o seu gado e vai pra junto do seu bem...". Eu vi o rei! Imagine o que causou para um menino aquela exuberância e grandiosidade que Gonzaga possuía. Que sintonia com os tum-tuns do coração teve as pancadas na zabumba! Naquele momento, com uma emoção incontida, minha nordestinidade foi ao limite. Foi uma noite memorável.
Suas músicas retratam de forma alegre e realista a vida sofrida do nordestino. A seca, a fome, a dor, o desprezo, o amor, o preconceito, a fé, os costumes, os valores... A migração por um pedaço de pão. Ainda hoje existe muito sofrimento, mas o Nordeste é outro depois de Lula Presidente. Nunca alguém cantou o Nordeste como Gonzagão. Pelo resgate da autoestima da nossa gente, será sempre lembrado.  
Suas músicas encantam!
Gonzaga cantou a dor. “Asa branca” – um hino nordestino – faz imaginar o sofrimento que é presenciar uma terra ardendo “qual fogueira de São João/ Sem nenhum pé de prantação”, e, por isso, perder o gado e morrer de sede o alazão.
Quando perdeu o amor, perguntou ao juazeiro: “Juazeiro, juazeiro/ Me arresponda, por favor/ Juazeiro, velho amigo/ Onde anda o meu amor? Ai, Juazeiro, como dói a minha dor”. E com saudade disse: “Ai quem me dera voltar/ Pros braços do meu xodó/ Saudade assim faz roer/ E amarga qui nem jiló”.
Quem não sofre ao lembrar o desgosto do “Assum preto”?  Vítima da “ignorança ou mardade das pió, furaro seus óio pra ele assim cantá de mió”.
Gonzaga também cantou as alegrias, cantou a vida do sertanejo, cantou o amor. Basta lembrar “O Xote das Meninas: O mandacaru, quando fulora na seca/ É o siná que a chuva chega no sertão/ Toda menina que enjoa da boneca/ É siná que o amor já chegou no coração...”. Através da poesia juntou imagens da fecundidade do mandacaru e da mulher!
Exaltou a morena da cintura de pilão: “Vem cá, cintura fina, cintura de pilão/ Quando eu abraço essa cintura fico frio, arrepiado, quase morro de paixão/ Pois teu corpo só foi feito pros cochilos do amor”.
Mostrou a ligação dos rios do Sertão com o mar: “Riacho do Navio/ Corre pro Pajeú/ O rio Pajeú vai despejar no São Francisco/ O rio São Francisco/ Vai bater no "mei" do mar”.
No canto da acauã despertou para a realidade do Sertão: “Na tristeza da seca/ Só se ouve acauã/ Te cala acauã/ Que é pra chuva voltar cedo”.
Na vida encontrou um pedaço de mal caminho: “Karolina... Mulé danada de carinhosa e dengosa! Mulé bonita, morena trigueira. Ah! Mulé bagunceira...
Assim foi Gonzaga... Amou e foi amado pelos nordestinos... Foi amado pelo mundo afora.  
Sua presença tá no aboio do vaqueiro, no canto do sabiá, nas águas do Pajeú, no som de um fole, numa sala de reboco, na porteira do curral, tá na feira de Caruaru, tá no fundo da lembrança... É seu Luiz, com isso parece que buli com a emoção de muita gente!
SAMUEL SALGADO.

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