Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
Neste início de abril, entre outros fatos da maior
importância para o Estado de Pernambuco, merecem destaque as denúncias,
tornadas públicas pela imprensa escrita (01/abril), do até então presidente da
Agência de Regulação de Pernambuco (Arpe) Roldão Joaquim dos Santos, ao deixar
o cargo.
A Arpe é uma autarquia especial, vinculada diretamente ao
Gabinete do Governador, e dotada de autonomia financeira, orçamentária,
funcional e administrativa. Foi criada em 2000 para fiscalizar os serviços
públicos delegados nas áreas de energia elétrica, saneamento e transporte, e os
contratos firmados pelo Estado por meio de Parcerias Público-Privadas (PPPs) e
com Organizações Sociais (OSs).
Na prática, a Arpe cuida de tudo em Pernambuco: ônibus,
Arena Esportiva, loterias, a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e
sua PPP de saneamento, pedágios na Ponte do Paiva e no Complexo Viário de
Suape, o gás natural canalizado, o empreendimento do Centro Integrado de
Ressocialização de Itaquitinga (conhecido como Presídio de Itaquitinga), a atuação
das Organizações Sociais de Saúde (OSSs), a organização social Centro de Abastecimento e
Logística de Pernambuco (Ceasa), e a Companhia Energética de
Pernambuco (Celpe), através de convênio federal com a Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel).
Roldão fez denúncias gravíssimas sobre o esvaziamento e a
retirada dos poderes da Arpe para atuar na sua missão constitucional de
fiscalizar. Deve-se lembrar que o papel da Arpe na regulação dos serviços
públicos delegados pelo Estado de Pernambuco é necessário para impedir o abuso
do poder econômico e garantir o acesso universal dos cidadãos a serviços de
qualidade com preços justos.
O que se esperava da Arpe, desde a sua criação, era uma agência
reguladora ética, transparente, justa e eficiente, que cumprisse plenamente as
suas funções, servindo à sociedade no equilíbrio dos interesses dos usuários,
do poder concedente (o Estado) e dos prestadores de serviços públicos
delegados. Infelizmente, isso não se verificou.
Segundo relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE)
sobre a prestação de contas do governador, no exercício de 2013, a Arpe
apresentava a totalidade dos cargos efetivos vagos. Trabalhava desde a sua
criação com o auxilio de poucos funcionários, cedidos por outros órgãos
públicos, e com pessoal contratado, temporário e comissionado, sem a devida
capacidade técnica, e sem uma estrutura física suficiente. Apesar de realizar
concurso público, em 2014, não houve a homologação dos resultados, e nem a
nomeação dos 35 técnicos aprovados. Ou seja, deliberadamente a Arpe não realizava
(nem realiza) o seu papel fiscalizador. As autoridades estaduais, demonstrando total
descaso, insistem em um faz de conta repudiado pela sociedade pernambucana. Esta
é a pergunta que não quer calar: quem está se aproveitando da inércia e da
inoperância da Arpe?
Ainda sobre as denúncias do seu ex-presidente, a Arpe está
impotente diante da situação surrealista de autofiscalização da Secretaria de
Saúde sobre as Organizações Sociais que atuam na saúde, uma delas é o Instituto
de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip).
Uma lei estadual (Lei 12.510/2013),
permite que contratos milionários (estimados em aproximadamente 500 milhões de
reais anuais) entre o Estado e o Imip, que administra três hospitais e 14
Unidades de Pronto Atendimento, sejam assinados, pagos e, ao mesmo tempo
fiscalizados pela Secretaria de Saúde, cujo secretario na época era Antônio
Figueira, ex-presidente do próprio Imip, e atual Secretário da Casa Civil. Em
março último, o TCE decidiu abrir um processo de auditoria especial para
fiscalizar as OSs da área de Saúde. Aguardemos.
Outra gravíssima acusação diz respeito ao impedimento da
Arpe de fiscalizar as PPPs para a construção do Presídio de Itaquitinga e da
Arena. Em ambos os casos, isso se deu com base em parecer da Procuradoria Geral
do Estado, cujo titular, na época, era Thiago Arraes de Alencar Norões, atual
secretário de Desenvolvimento Econômico. Tal situação levou o Tribunal de
Contas do Estado a abrir auditorias especiais nas PPPs da Arena e do presídio
de Itaquitinga. Estes dois empreendimentos, verdadeiros elefantes brancos para
o Estado, se tornaram grandes sumidouros de recursos do erário público. No caso
da Arena, o contrato assinado com a Arena Pernambuco Negócios e Investimentos
S.A (Odebrecht) obriga o governo do Estado a cobrir os rombos no faturamento
anual caso a receita seja 50% da meta (R$ 110 milhões, atualizados). Por isso,
o governo repassou, em 2014, R$ 87 milhões e pagará, em 2015, mais R$ 93 milhões.
Sem dúvida, um negócio entre amigos, realizado pelo governo com o dinheiro do
povo pernambucano.
As críticas e denúncias do Roldão devem ser investigadas, doa a quem
doer, pois imperou nestes episódios a total falta de transparência do governo
estadual, acarretando vultosos prejuízos ao erário público.
Todavia, cumpre ressaltar que também deve ser investigada a
responsabilidade do Sr. ex-presidente, que desde 2011 estava à frente da Arpe,
e, só agora, ao entregar o comando da Agência, vem a público. Foi cúmplice,
sim, pois não tomou as medidas que deveria tomar, informando à sociedade o que
estava ocorrendo.
O povo pernambucano merece e exige esclarecimentos cabais do Sr.
Ex-presidente da Arpe e do Sr. Governador do Estado.
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