quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Artigo de opinião: Saco de bondades para empresas elétricas


Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco.
 
O que o cidadão brasileiro não aceita mais é a benevolência, para se dizer o mínimo, com que as empresas elétricas são tratadas pelo Governo Federal.

Dois pesos e duas medidas. Enquanto a população brasileira sofre e é prejudicada com a queda vertiginosa da qualidade do serviço elétrico oferecido e com as altas tarifas, muito pouco é feito para reverter essa situação, já que sistematicamente as empresas elétricas de geração, transmissão e distribuição são “aliviadas” dos compromissos, inclusive contratuais, por quem deveria regulá-las r fiscalizá-las.

Os “apagões” e “apaguinhos” já são constantes na vida das pessoas, que sofrem as consequências de um péssimo serviço prestado. Além da incompetência gerencial, essas empresas, carentes de manutenção, investimentos, modernização e qualificação, porém com lucros cada vez maiores, ainda pressionam e conseguem com os gestores de plantão, mais e mais benefícios. Uma prática que se resume a um “capitalismo sem risco” para quem está ou aventurou-se nesse negocio. E não são poucos os aventureiros de primeira viagem.

A população sofre as mazelas de ter as frequentes interrupções de energia já incorporadas ao seu cotidiano e tudo o que isso acarreta. E mesmo assim, precisa pagar tarifas caras (e aí de quem não pagar ou atrasar o pagamento).

Vejamos então, mais recentemente, algumas medidas que constituem verdadeiro “saco de bondades” oferecidas àquelas empresas.

No setor de geração, a resolução da Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel) nº 595/2013, de dezembro passado, prevê algumas “bondades”, como por exemplo, a tolerância de três meses de atraso para a aplicação de sanções e a exclusão de responsabilidades ao gerador nas situações em que o atraso na operação ocorrer por caso “fortuito” ou “força maior” (?).
Também poderá repassar ao consumidor o valor integral da energia comprada no mercado para atender a seus compromissos. O que significa que o consumidor vai pagar pela ineficiência das empresas, que deixaram de produzir a quantidade de energia contratada no tempo determinado.
Complementando sua quota de geração com a compra de energia às termelétricas (energia mais cara), repassando o aumento do preço da energia daí resultante ao Governo Federal, e, assim, aos contribuintes.
Na resolução anterior, de 2005, a de nº 165, as regras eram mais severas, pois as geradoras, quando atrasassem seus compromissos, não podiam repassar aos consumidores os gastos extras.

Na transmissão, segundo relatório da Aneel, os atrasos chegam a quatro anos. Na média, o descumprimento do cronograma supera em 13 meses o prazo original previsto no contrato de concessão. Mais de 70% de todas as obras de transmissão estão com o cronograma atrasado. Ou, das 129 companhias do setor de transmissão, 57 apresentaram atrasos no cronograma de obras.
O documento avaliou as obras concluídas após dezembro de 2010 e as que estavam em andamento até dezembro do ano passado. O resultado mostrou uma piora gradual no setor nos últimos anos. De acordo com a legislação, a empresa que tiver mais de três autos de infração e atraso acima de 180 dias não pode participar, sozinha, de novos leilões de energia. A campeã nesse quesito é a estatal Chesf, com 17 autos de infração.
E nada é feito para modificar tamanha incompetência e falta de planejamento.

Na distribuição, o “lobby” é estruturado e organizado. Capitaneados pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), constantes benesses têm sido “conquistadas”. A mais recente é a proposta de firmar Termo de Compromisso de Ajuste de Conduta (TAC) entre a Aneel e as concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços e instalações de energia.
O TAC poderá ser firmado quando forem encontrados descumprimentos quanto à qualidade dos serviços de energia elétrica, a segurança das pessoas e das instalações de energia, a expansão, reforços e melhorias das redes de energia, assim como dos sistemas de proteção e controle do sistema elétrico.
Também será possível, em alternativa à aplicação de multas, impor às concessionárias pena substitutiva consistente em Obrigação de Realização de Ações e Investimentos. O pedido de imposição de pena substitutiva será apreciado pela diretoria da Aneel e, se aprovado, a concessionária terá o prazo de 30 dias para apresentar a descrição e o cronograma detalhado das ações e investimentos a serem implementados.
Ou seja, será uma alternativa dada às distribuidoras, em lugar da continuidade de processo fiscalizatório ou punitivo.

Enquanto o cidadão convive com a péssima prestação de serviço, as companhias são agraciadas, favorecidas e estimuladas pelo poder publico com “facilidades” para continuarem a “desrespeitar” os que necessitam de energia elétrica. É hora de dar um basta. A solução está com o povo.

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