Vinicius Torres Freire - Folha de S.Paulo
Não
é muito difícil puxar um coro de "Fora, Temer!" no Carnaval de um país
esfolado pela recessão, rachado por ódios variados e com um presidente
tão popular quanto a Dilma Rousseff dos últimos dias.
É
um tanto menos difícil fazê-lo em São Paulo, por exemplo, onde tantos
blocos juntam pessoas do "mundo da cultura", vamos simplificar assim,
que em geral consideram Michel Temer repugnante. Houve protestos
carnavalescos notáveis também em Salvador, Rio, Belo Horizonte e Recife.
Dilma
não teve blocos berrantes contra si, apesar das vaias em certos jogos
de futebol. Sim, teve milhões nas ruas pedindo a sua cabeça, em outros
tipos de desfiles, com outras turmas.
De
qualquer modo, os gritos não soam nada bem para Temer, na véspera de um
mês que parece muito cinzento para o governo. Mês de ministros no
cadafalso, mês de delações mortíferas, de protestos de rua, talvez
greves e, crucial, dos primeiros testes da reforma da Previdência.
Mas
não apenas. Boa parte do povo ainda não sente melhorias, afora no caso
da inflação, talvez um tico melhor com o FGTS. Mas ainda tem muita coisa
ruim na contramão.
Tome-se
o caso das taxas de juros nos bancos. Em vez de cair, têm subido desde
outubro, quando o Banco Central começou a reduzir a Selic, a taxa
"básica" da economia, e a inadimplência e o custo do dinheiro para os
bancos passaram a cair.
Não vem muito ao caso a economia da coisa, porém.
O
povo endividado e exaurido nas ruas não viu queda alguma de juros. Para
piorar, dissemina-se mesmo entre gente da elite uma onda nova de
irritação contra os juros.
O
governo, mesmo no feriado, diz que "está alerta" e "ao longo de março"
vai tomar alguma atitude, sabe-se lá qual, pois não há muito a fazer no
curtíssimo prazo. Talvez o governo faça alguma marola midiática. Quanto a
desemprego, porém, nada terá a dizer.
O
PMDB vai alardear os ditos feitos de Temer em campanhas publicitárias: o
direito de sacar o FGTS, inflação e juros em baixa. O governo vai
continuar a animar a torcida, como o faz desde janeiro, acenando com os
pompons do fim da recessão, o que para quase qualquer pessoa da rua é
uma abstração, mesmo que seja verdade.
Talvez gaste melhor o seu verbo convencendo deputados a aprovar a reforma da Previdência.
Em
caso de naufrágio previdenciário, Temer perde parte da boa vontade da
elite econômica reformista, que talvez ainda lhe dê apoio como um tampão
(uma eleição de novo presidente no Congresso promoveria confusão e
recaída econômica).
Mas,
com menos corda para segurar a pinguela econômica, pode haver menos
apoio para segurar a cassação de Temer no TSE. Sim, a discussão é quase
explícita.
O
governo está entre a cruz possível das "ruas", iradas por vários
motivos e de mau humor com a mudança na aposentadoria, e a caldeirinha
acesa das reformas em risco e do decorrente estrago econômico e político
(entre a elite).
"Cruz possível" das ruas, ressalte-se o possível: seria preciso uma conturbação grande para abalar ou imobilizar o governo.
Por
ora, há a promessa de protesto de esquerda marcado para uma
quarta-feira, dia improvável para ajuntamento de massa, e protesto de
direita "para inglês ver", contra a corrupção dos amigos de Temer.
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