JULIANA COISSI UOL
No último dia 8, um rapaz de 18 anos foi preso em Jales (585 km a
noroeste de São Paulo) sob suspeita de ter assaltado um posto de
combustíveis e uma farmácia, levando R$ 1.500. Ao saber do caso, já na
delegacia, o pai do jovem, o ajudante de pedreiro Dorivaldo Porfírio de
Lima, 44, decidiu procurar as duas supostas vítimas para ressarcir o
prejuízo. Sem recursos, assinou promissória para parcelar e pagar a
dívida.
*
Eu nunca havia pisado em uma delegacia antes, graças a Deus. Só passava na frente.
Meu filho caçula Bruno estava jogando bola lá perto de casa quando um
policial veio e o prendeu. Eu estava na casa da minha irmã. Não estava
trabalhando porque está difícil arrumar serviço como ajudante de
pedreiro --tem dia que tem, mas passa muitos dias sem ter.
Minha mulher ligou: "Estão prendendo o Bruno, nosso filho". Pensei: "Vou
direto na delegacia saber o que é isso". Porque meu filho é
trabalhador, pedreiro como eu. Ajuda a pagar as contas. E nunca tinha
visto nada estranho em casa, como dinheiro, arma, droga.
Eu e minha mulher sabíamos que ele usava maconha, e desconfiávamos que
tinha alguma outra droga, porque ele chegava às vezes meio irritado. Ele
contou para a gente que usava, pediu para ser internado. Estávamos
arrumando uma comunidade [terapêutica] aqui com a Igreja Católica, mas
aí ele foi preso.
No caminho da delegacia, pensei que talvez poderia não ser nada. Ele
estava trabalhando certinho, mas sempre tem as más companhias.
Quando cheguei, me mostraram as imagens dele [captadas pelas câmeras de
segurança do posto e da farmácia]. Fiquei meio em dúvida, porque nunca
tinha visto aquelas roupas. Mas ficaram falando lá que foi ele, foi ele,
então a gente fica quieto. E não o vi ainda desde que foi preso [em 8
de outubro].
Falaram o valor roubado por ele e um colega: R$ 600 da farmácia e R$ 900 do posto. Era bastante.
Veio na hora a vontade de devolver o dinheiro. Quando o filho não
presta, os pais abandonam, nem vão atrás. Mas corri atrás para mostrar
caráter, o que é certo. E porque ele é trabalhador, não é vagabundo. A
avó do outro rapaz [suspeito de participar dos roubos] me disse que os
pais nem vão atrás do menino, que ele já não tem jeito.
No meu caso não. Não é porque é meu filho, mas eu acho que ele tem conserto.
No dia seguinte fui ao posto e perguntei quem era o dono. O próprio
respondeu, é até conhecido meu. Contei o acontecido com o Bruno. "Era
teu filho? Não acredito", ele disse. E eu: "Se meu filho fez isso, quero
parcelar e pagar". Ele não acreditou, ficou surpreso com a honestidade.
Eu disse: "Acredite porque, se for meu filho, vou pagar porque ele é
trabalhador".
Reproduçao/TV Globo | ||
O ajudante de pedreiro Dorivaldo Porfírio de Lima, 44, quer devolver dinheiro que o filho teria roubado de dois comércios |
Pedi para parcelar os R$ 900 em promissórias de R$ 90. O ganho da gente é
pouco, não chega ao fim do mês. A diária [de auxiliar de pedreiro] é R$
70, mas às vezes você consegue trabalhar dois dias na semana, depois
para.
Fiz a mesma coisa na farmácia. O dono falou que como foram dois
envolvidos no roubo, ele dividiria os R$ 600 em R$ 300. Mas soube depois
que um comerciante viu a história na TV e pagou a conta.
Se não der para pagar os R$ 90 do posto no fim do mês, eu pago R$ 40, R$
50, o que der. Se hoje em dia a gente andando no caminho certo já corre
o risco de alguma coisa dar errado, imagina se andar no caminho errado?
Dá mais errada ainda a vida, e as pessoas não confiam na gente.
Mostrei as promissórias ao delegado. Ele disse que nunca viu ninguém
fazer isso. Ele sabe que todo mundo é trabalhador na minha família.
Queria agora é tentar lutar para colocá-lo numa comunidade [terapêutica]
para se tratar. Já ofereceram vaga de graça. Como meu filho já tinha
pedido ajuda para ser internado, ele merece, não é?
Nenhum comentário:
Postar um comentário