Heitor
Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de
Pernambuco
Sem
dúvida é grave a situação do setor elétrico. E pode se tornar dramática se
medidas urgentes não forem tomadas. Pode-se até repetir o desabastecimento
ocorrido há 15 anos, por deliberada decisão política de não se fazer os
investimentos necessários na geração, transmissão e distribuição de energia.
As
condições de hoje não são as mesmas do passado recente, mas os resultados da
atual crise poderão ser idênticos. A oferta e o consumo de energia cresceram,
como também cresceu a malha de transmissão. Mas nada cresceu como a ganância
das distribuidoras privatizadas que – lastreadas em contratos draconianos de
concessão (também chamados de privatização)– impõem ao consumidor uma das mais
caras tarifas de energia elétrica do mundo, enquanto a qualidade dos serviços
prestados é sofrível. E piora com o passar do tempo.
Para
o não especialista, ávido por compreender o que se passa para ter a sua opinião,
reina uma grande confusão. Pois uma grande parte dos chamados “especialistas”,
convidados a opinar e debater, e dos chamados “articulistas”,ou “formadores de
opinião”, acaba cometendo uma fraude contra os cidadãos. Querem fazer crer que
o que dizem são comentários objetivos, isentos, sem ideologia. Quando estão, na
verdade, comprometidos com os interesses das empresas, do capital, do mercado.
Não
assumir a visão ideológica é cinismo, empulhação. Dizem acreditar de fato que a
mão invisível do mercado pode tudo, que o liberalismo é o que pode resolver os
problemas existentes. Problemas esses
resultantes essencialmente da mercantilização da energia elétrica, promovida
pelos guardiões do pensamento do mercado a partir de 1995, e que culminou no
racionamento de 2001/2002. Em 2004, depois de sofrer pequenas mudanças
cosméticas, o Modelo do Setor Elétrico passou a ser chamado de “Novo Modelo do
Setor Elétrico”.
Dizem
que a situação vai de mal a pior por obra e culpa do governo de plantão. Falam
em nome de uma ideologia à qual devotam uma crença inabalável, e prestam um
desserviço aos interessados em informações, quando emitem opiniões baseados em
um só lado da moeda. Partidarizam a discussão, fazem a luta política em um
contexto no qual a política elétrica atual é uma continuação daquela de
governos e partidos políticos que governaram o país desde o começo da Nova
República. É o sujo falando do mal lavado.
O
que esses “especialistas” não questionam é a existência de uma concentração de
poderes e de um acentuado caráter autoritário na condução da política do
setor elétricono país, o que acaba subordinando o futuro ao presente.
Verifica-se que, ao longo do tempo, feudos partidários foram instalados no
governo federal, sendo um deles o Ministério de Minas e Energia, cujo segundo
escalão concentra muitos órgãos com alto e forte poder de decisão financeira e
administrativa. É uma excrescência este ministério, tão relevante e estratégico
ao país, ser considerado como moeda de troca no “toma lá, dá cá” das
composições políticas. E o loteamento político do atual Ministério de Minas e
Energia repete fórmulas já usadas nos governos anteriores.
Preconiza-se,
com urgência, uma maior publicização da questão energética na sociedade, incentivando
o debate de ideias e o confronto de interesses em condições adequadas de
informação e conhecimento, se constituindo assim em instrumentos fundamentais
na formulação de uma estratégia energética sustentável e democrática. A
democratização do planejamento do setor energético por meio da abertura de
espaços efetivos e transparentes de participação e controle social é tarefa
para ontem.
Dentre
as medidas recentes tomadas para combater a crise elétrica, uma que se
convencionou chamar de “realismo tarifário” promoveu um aumento desproporcional
e despropositado das tarifas elétricas, beneficiando diretamente o caixa das
distribuidoras, que exercem um forte lobby
junto às autoridades do setor elétrico. Sem dúvida, energia mais cara
acarretará menor consumo, que assim aliviará, em parte, a pressão sobre a demanda,
i.e. sobre o sistema como um todo.
Entre essas e tantas, debater a regulação econômica
da mídia é mais do que necessário é urgente. Somente assim poderemos almejar
uma sociedade com mais pluralismo e mais democracia, com cidadãos que poderão
olhar criticamente uma notícia sob variados pontos de vista e não apenas a
partir da “verdade única” dos colunistas, dos “especialistas”, desses
endeusadores do oráculo do mercado.
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