domingo, 5 de abril de 2020

Passaporte de Guedes é delírio de quem vê seu mundo cair



POR FERNANDO BRITO · no Tijolaço

Quando o sujeito está desesperado, compreende-se que comece a delirar com milagres que o venham salvar.

É o caso deste governo, seus jejuns, sua hidroxicloroquina e, agora, o “passaporte de imunidade” com que Paulo Guedes acena para que as atividades normais possam ser retomadas.

Reproduzo a “pérola” dita ontem pelo Ministro da Economia em uma teleconferência com empresários:

— Hoje de manhã, conversávamos com um amigo da Inglaterra que criou o passaporte da imunidade. Ele faz 40 milhões de teste e coloca disponível para nós brasileiros, 40 milhões de testes por mês. Já mandei para o ministro Mandetta, para o chefe da Casa Civil, ministro Braga Netto e para o presidente Jair Bolsonaro. Ou seja, se você fez o teste e deu positivo, você pode circular. Você fez o teste e deu negativo, você tem que ir para casa. Não é agora. Agora nós estamos em isolamento. Nós estamos planejando uma saída, lá na frente e termos esse teste em massa. As pessoas vão sendo testadas, pode ser semanalmente e quem estiver livre, continua trabalhando.

Vejam só: “um amigo” que faz 40 milhões de testes? Onde, na cozinha de casa, como se fossem brigadeiros para uma festinha? O amigo de Guedes, portanto, se não é um louco siderado, é um dono de indústria farmacêutica esperto que quer empurrar testes de araque para cima do Brasil, quem sabe com efeitos colaterais positivos para alguém.

O Brasil precisa de testes – e não dos de araque -, sim, para rastrear a doença, para determinar situações de isolamento quase total e para garantir a sanidade do pessoal médico que está na linha de frente, trabalhando em situações de risco. E não os tem.

O Brasil, com sua enorme população, é o 16° país em número de casos de infecção por coronavírus. Mas certamente sua posição é bem mais acima nesta tabela mortal, porque estamos, pasme, apenas em 100° lugar em aplicação de testes: meros 258 para cada milhão de habitantes, uma proporção abaixo de 50 vezes menor que os países europeus.

E mesmo os testes que recebemos – meio milhão deles, doados pela Vale – são umas porcarias que, segundo o próprio Ministro da Saúde, têm apenas 30% de eficácia e sequer são endossados pela OMS. Leia-se: para cada positivo que detecta, deixa escapar outros dois.

Não é preciso mais para ver quanta gente está contaminada e não aparece nas estatística apenas porque não apresentou (ainda) sintomas da doença.

O desespero de Guedes ante uma realidade que clama por dar e não por tirar dos pobres e de fortalecer, em lugar de minguar, os serviços públicos está neste ponto, o de perder o contato com a realidade em seu desejo de que as pessoas humildes façam o contrário do que fez: permanecer em casa, isolado, em busca da chance de que o vírus pare de circular.

Ou, pior ainda, de nem envergonhar-se de uma picaretagem do “amigo”, porque cada teste, do mais “baratinho”, custa R$ 75.

É nas mãos desta gente que está o Brasil.

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