Dezenas de advogados penalistas e constitucionalistas redigiram
manifesto contra a Operação Lava Jato. O documento será divulgado amanhã
nos principais veículos de comunicação. Os advogados, entre eles
defensores de políticos e empreiteiras sob suspeita de formação de
cartel no esquema de corrupção instalado na Petrobras entre 2004 e 2014,
afirmam que "no plano do desrespeito a direitos e garantias
fundamentais dos acusados, a Lava Jato já ocupa um lugar de destaque na
história do país".
"Nunca houve um caso penal em que as violações às regras mínimas para
um justo processo estejam ocorrendo em relação a um número tão grande
de réus e de forma tão sistemática", afirmam.
O manifesto, que não cita nenhum protagonista da força-tarefa da Lava
Jato, será distribuído apenas alguns dias depois que o ministro Ricardo
Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, manteve na prisão o
empreiteiro Marcelo Odebrecht - capturado na Operação Erga Omnes no dia
19 de junho de 2015, por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro.
Subscrevem o documento nomes de grande prestígio na advocacia,
profissionais que ao longo de muitas décadas travaram embates memoráveis
nos tribunais, como Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, Antonio Carlos
de Almeida Castro Kakay, Nabor Bulhões e Antonio Sérgio de Moraes
Pitombo. O ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp
também assina o manifesto.
Um trecho da carta ainda em revisão é categórico: "O desrespeito à
presunção de inocência, ao direito de defesa, à garantia da
imparcialidade da jurisdição, o desvirtuamento do uso da prisão
provisória, o vazamento de informações seletivas e confidenciais, a
execração publica dos réus, dentre outros graves vícios, estão se
consolidando como marca da Lava Jato, com consequências incalculáveis
para o presente e o futuro da justiça criminal brasileira."
A carta diz que "o que se tem visto nos últimos tempos é uma espécie
de inquisição, ou neoinquisição, em que já se sabe, antes mesmo de
começarem os processos, qual será o seu resultado, servindo as etapas
processuais que se seguem entre a denúncia e a sentença apenas para
cumprir 'indesejáveis' formalidades".
Segue o esboço do documento: "Nessa última semana, a reportagem de
capa de uma das mais vendidas revistas semanais brasileiras não deixa
dúvida à gravidade do que aqui se passa. Numa atitude ignominiosa e
tipicamente sensacionalista, fotografias de alguns dos réus (extraídas
indevidamente de seus prontuários na Unidade Prisional em que aguardam
julgamento) foram estampadas de forma vil e espetaculosa, com o claro
intento de promover-lhes o enxovalhamento e instigar a execração
pública. Trata-se, sem dúvida, de mais uma manifestação da estratégia em
prejuízo da presunção da inocência das pessoas e da imparcialidade que
haveria de imperar nos julgamentos dos acusados - que tem marcado, desde
o começo, o comportamento desvirtuado estabelecido entre os órgãos de
persecução e alguns setores da imprensa."
O texto deverá apontar também: "Esta é uma prática absurda e que não
pode ser tolerada numa sociedade que se pretenda democrática, sendo
preciso reagir e denunciar tudo isso, dando vazão ao sentimento de
indignação que toma conta de quem tem testemunhado esse conjunto de
acontecimentos. A operação Lava Jato se transformou numa Justiça à
parte. Uma Justiça que se orienta pela tônica de que os fins justificam
os meios, o que representa um retrocesso histórico de vários séculos,
com a supressão de garantias e direitos duramente conquistados, sem os
quais o que sobra é um arremedo de processo, enfim, uma tentativa de
justiçamento, como não se via nem mesmo na época da ditadura."
Os advogados afirmam: "É inaceitável - como já se fez várias vezes,
sendo a última e mais inadmissível em face de Ministro integrante de uma
das mais altas Cortes do país - que magistrados sejam atacados ou
colocados sob suspeita pelo fato de decidirem ou votarem (de acordo com
seus convencimentos e consciências) pelo restabelecimento da liberdade
dos réus, a ponto de se fazer necessária, em desagravo, a insurgência e a
manifestação de apoio e solidariedade de entidades associativas de
juízes. Isto é gravíssimo e além de representar uma tentativa de
supressão da independência judicial, revela que aos acusados não está
sendo assegurado o direito a um justo processo."
Os causídicos da Lava Jato avaliam que "é de todo inaceitável, numa
justiça que se pretenda democrática, que a prisão provisória seja
indisfarçavelmente utilizada para estimular a celebração de acordos de
delação premiada, como, aliás, já defenderam publicamente alguns
Procuradores que atuaram no caso".
"Num dia os réus estão encarcerados por força de decisões que afirmam
a imprescindibilidade de suas prisões, dado que suas liberdades
representariam gravíssimo risco à ordem pública; no dia seguinte, fazem
acordo de delação premiada e são postos em liberdade, como se num passe
de mágica toda essa imprescindibilidade da prisão desaparecesse. No
mínimo, a prática evidencia o quanto artificiais e puramente retóricos
são os fundamentos utilizados nos decretos de prisão. É grave o atentado
à Constituição e ao Estado de Direito e é inadmissível que Poder
Judiciário não se oponha a esse artifício."
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