No dia 17, uma quarta-feira, Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) se trancou em seu quarto no Lotte New York Palace, hotel em Manhattan com diária mínima de US$ 350 (R$ 1.150).
As notícias do Brasil lhe arrastavam para o epicentro do novo armagedon político: o empresário-delator Joesley Batista gravara uma conversa comprometedora deles, e a Polícia Federal tinha fotos em que Loures saía de uma pizzaria carregando R$ 500 mil, em 10 mil notas de R$ 50, numa mala preta –suposta propina da JBS.
Na noite da véspera, o hoje deputado afastado pôs smoking para cortejar o prefeito de São Paulo, João Doria, numa mesa de destaque em jantar de gala à base de vinho e salmão, entre esqueletos de dinossauros no Museu de História Nacional nova-iorquino. Doria recebia da Câmara do Comércio Brasil-EUA o prêmio de Personalidade do Ano.
O peemedebista tentou se enturmar com Geraldo Alckmin, também lá. O governador contou uma piada e, em menos de um minuto, deixou a roda.
Loures pagou a viagem do próprio bolso, segundo sua assessoria. Prestigiava um bom contato profissional. Não era, afinal, a primeira vez em que circulava com desembaraço em eventos ligados a Doria.
Em 2016, às vésperas do impeachment de Dilma Rousseff, ele, então chefe de relações institucionais do vice Michel Temer, era um dos mais assediados no Wish Golf Resort Convention –palco em Foz do Iguaçu (PR) do fórum anual do Lide - Grupo de Líderes Empresariais, do Grupo Doria.
No crachá, por engano, constava "assessor da Presidência da República", em vez de vice. Não reclamou. "Deve ter sido ato falho do João [Doria]", brincou à época.
Tratado como "ministro informal", anotava pedidos de empresários e prometia audiências. Dessa vez, estadia e translado foram pagos pelo Lide -que convidou outros 19 políticos, como Romero Jucá (PMDB-RR) e José Sarney Filho (PV-MA).
Loures já estivera no encontro de empresários em 2013 e voltou ao fórum deste ano. Foi quando tirou uma foto com Doria e a postou no Facebook, citando o "amigo e prefeito".
O retrato sumiu do mapa. Na esteira do escândalo, a assessoria de imprensa do deputado deletou toda a sua página da rede social.
Outro vestígio da relação com Doria continua on-line: o site do Tribunal Superior Eleitoral registra uma transferência eletrônica de R$ 50 mil do "sr. João Agripino da Costa Doria Junior" para sua campanha de 2014 à Câmara dos Deputados.
A equipe de comunicação do prefeito diz se tratar de "doação pessoal, com recursos próprios, quando o então candidato a deputado ainda não era alvo das suspeitas que hoje recaem sobre ele". E reforça: "Não é possível fazer ilações sobre fatos relatados três anos depois da referida doação".
À Folha, no sábado (20), Doria definiu Loures como "uma pessoa a quem eu tinha estima" e disse "lamentar muito essa conduta". Ao peemedebista cabe se defender e, se culpado for, "aceitar as consequências". Lembrou ainda que "eu estava presente e ele também" em evento do Itaú.
Os dois participaram de conferência do banco em Nova York. Na cidade, Loures se reuniu com possíveis investidores a convite do Eurasia Group. "Ele estava em NY para o evento do prefeito, e o convidamos para falar com nossos clientes sobre as reformas no Congresso", afirma Alexsandra Sanford, diretora de comunicação da consultoria.
Na conversa com Joesley Batista, Loures já divagara sobre a dupla jornada de político e empresário. "Sabe que eu sou uma espécie de híbrido? Como venho da iniciativa privada -a gente tem a nossa empresa-, vivo da vida real, das dificuldades e oportunidades da vida empresarial."
A empresa em questão é a Nutrimental, que seu pai fundou em 1968, produzindo feijão desidratado para merenda escolar. O perfil da companhia mudou após Rodriguinho, como o deputado afastado é chamado, inventar barrinhas de cereais depois batizadas de Nutry -pedido do navegador Amyr Klink, que queria algo leve e saudável para suas viagens.
A ideia aproximou o clã do PIB –o pai, homônimo seu, preside o conselho de inovação da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
A política também está no DNA dos Loures desde os tempos do Paraná província: um ascendente de Rodriguinho foi deputado provincial entre 1862 e 1863, e seu avô, deputado nos anos 1950.
Em sua primeira campanha (foi eleito à Câmara em 2006), bradou: "Sou bisneto, neto e filho de uma dinastia que serve ao Paraná! Do alto da pirâmide milionária da Fiep [Federação das Indústrias do Paraná] nos contemplam 500 anos de fome, subdesenvolvimento e analfabetismo político".(Do blog de Magino Martins)