Jânio de Freitas - Folha de S.Paulo
A
renovada notícia sobre obras em um sítio que a família de Lula
frequentaria, na paulista Atibaia, dá oportunidade à recuperação de dois
casos reais da afinidade rural comum a presidentes e empreiteiros.
Embora um caso se passasse na ditadura e outro na democracia, a
discrição que os protegeu teve a mesma espessura.
A
ótima localização de um sítio em Nogueira, seguimento de Petrópolis,
não chegava a compensar o aspecto simplório dada à área, nem a
precariedade da casa. Em poucos meses, porém, acabou o desagrado do
general-presidente com as condições locais. O terreno foi reurbanizado, a
casa passou a ser um moderno bangalô de lazer. Surgiram piscina, uma
pista de hipismo, estrebaria, estacionamento e um jardim como as flores
gostam. Uma doação da empreiteira Andrade Gutierrez ao general
Figueiredo, então na Presidência.
Em
poucos anos de novo regime, a Andrade Gutierrez podia provar que sua
generosidade não padecia de pesares nostálgicos. Proporcionou até uma
estrada decente para a fazenda em Buritis, divisa de Goiás e Minas, que o
já presidente Fernando Henrique e seu ministro das Comunicações e sócio
Sérgio Motta compraram em operação bastante original. Como a democracia
tem inconvenientes, dessa vez a estrada foi guarnecida de um pretexto:
era só dizer que serviria a uma área que a empreiteira comprara ou
compraria na mesma região.
O
sítio que não é de Lula, mas recebeu-o em visitas injustificadas para a
imprensa e depois para a Lava Jato, entrou nas fartas suspeições de
crime quando "Veja" e logo Folha noticiaram, em abril do ano passado: a
OAS de Léo Pinheiro "realizou uma reforma em um sítio a pedido do [já]
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva", área de 173 mil m² dos sócios
de um filho de Lula.
A
descoberta desse fato deu-se, disse a notícia, nas "anotações feitas
por Léo Pinheiro no Complexo Médico Penal, em Curitiba". Mas, como
ninguém da Lava Jato falou nada, os jornalistas calaram o assunto por
sete meses. Ou até que, em novembro, a opinião pública foi blindada com a
aparente notícia de que "a Polícia Federal investiga se a OAS
beneficiou a família do ex-presidente" Lula "ao pagar por obras" no
sítio "frequentado pelo petista e seus parentes". Mas a obra deixara de
ser "realizada" pela OAS para ser apenas "paga" pela empresa.
Nove
meses depois da revelação, o sítio reaparece, ainda sem um
esclarecimento da Polícia Federal e da Lava Jato: não houve delação a
respeito, logo, só se investigassem. Nem por isso faltam novidades:
sumiram a OAS e Léo Pinheiro e entrou a Odebrecht, empreiteira da moda.
Citada por uma senhora vendedora de material de construção e um
carpinteiro, com alegada base em alguns recebimentos que tiveram. E a
tal anotação de Léo Pinheiro, que falava em OAS? Outra tapeação?
Figuras
imaculadas, deve ter sido para não ver os seus novos bens em tal
protelação e barafunda que Figueiredo, Fernando Henrique e Sérgio Motta
preferiram que ninguém soubesse deles. Mas o sítio de Atibaia mostra bem
o quanto fatos relevantes, pelas suspeitas-já-acusações que os
utilizam, estendem consequências no tempo e confundem a indefesa opinião
pública.
Como o sítio de Atibaia, há muitos fatos e circunstâncias, não só da Lava Jato, na atualidade brasileira.
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