Em 1938, o escritor Graciliano Ramos escreveu o romance Vidas
Secas, onde retratava a vida miserável de uma família de retirantes
sertanejos obrigada a se deslocar, de tempos em tempos, para áreas menos
castigadas pela seca. Passados 77 anos, ainda vivenciamos fatos que nos
fazem lembrar Fabiano, personagem daquela época, que vivia à espera da
chuva para aliviar a fome e a miséria. É incrível e inaceitável, em
pleno ano de 2015, ainda acompanharmos cenas de pessoas desesperadas nas
filas de carros-pipa, e animais morrendo de fome e sede.
Mesmo os movimentos e as Organizações Sociais, a exemplo da
Fetape, pautando, há anos, os governos federal e estadual sobre essa
situação, inclusive entregando, em 2013, um Documento com Diretrizes
para a Convivência com o Semiárido, tem sido dada pouca ou nenhuma
importância às reivindicações e propostas apresentadas. Desde que Paulo
Câmara assumiu o Governo do Estado, sequer foi aberta uma agenda para o
diálogo com essas instituições.
Estamos falando de uma grave crise hídrica, que esta penalizando o
nosso povo. Atualmente, 126 municípios estão com decreto de emergência,
e, segundo a APAC, os reservatórios estão com apenas 6% da capacidade
total.
Há uma falta de visão dos governantes sobre a importância de se
levar água às áreas rurais, não apenas para consumo das pessoas, mas
para a produção. Estima-se que Pernambuco tenha perdido, nesta grande
estiagem, cerca de 800 mil animais. Só para se ter uma idéia, a bacia
leiteira perdeu 70% da sua capacidade de produção. Esses problemas
atingem diretamente a agricultura familiar, que é a grande responsável
pelo abastecimento de carnes e alimentos na maioria das cidades do
Estado.
É verdade que, nos últimos anos, conquistas importantes
aconteceram na vida das populações do semiárido, especialmente para os
trabalhadores e trabalhadoras rurais. O Pronaf, o Garantia Safra, o
Bolsa Família, a Aposentadoria Rural promoveram uma revolução importante
em relação aos flagelos e às carências daquela época. Pois, mesmo
Pernambuco entrando no quinto ano consecutivo de seca, não temos
registrado saques aos mercados e feiras livres do Estado e nem pessoas
morrendo de fome.
É um grande erro pensar as políticas de recursos hídricos apenas
considerando as cidades. Vale, evidentemente, lembrar que há programas
federais importantes sendo executados no Estado, como a integração de
bacias, as adutoras e o programas de construção de cisternas, que têm
e/ou terão um impacto extremante importante para a vida das famílias
dessa região. No entanto, esses projetos estão muito lentos, por conta
da burocracia, do contingenciamento de recursos e da falta de
prioridade, o que tem imposto, mais uma vez, um drama às famílias do
Agreste e do Sertão.
É preciso acelerar obras estruturadoras como a transposição do
Rio São Francisco e as Adutoras do Agreste e Pajeú, bem como ampliar
ações emergenciais, que assegurem a recuperação de poços e o aumento de
carros-pipa. Ao invés de os governos ficarem jogando suas
responsabilidades uns para os outros, é preciso arregaçar as mangas e
agir. Não é possível que as famílias fiquem à mercê do retorno da
indústria da seca, para ter uma água digna para beber. Afinal, será que é
preciso lembrar aos gestores que o acesso à água é um direito humano?
*Doriel Barros é presidente da Fetape.
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