Batizada de "Siga o dinheiro", investigação aberta
pela Polícia Federal e pelo Ministério Público apura a informação de
que R$ 3 milhões arrecadados por Andrea Matarazzo junto à Alstom teriam
ajudado a bancar a reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso,
em 1998; outro personagem que desponta na trama é o ex-genro de FHC,
David Zylberstajn, ex-secretário de Energia de São Paulo, que teria
organizado os cartéis; reportagens da Folha e da própria Veja em 2000
confirmaram o caixa dois tucano e a arrecadação feita por Matarazzo;
escândalo se aproxima da cúpula tucana
247 - Uma
reportagem publicada pelo 247 no dia 13 de agosto revela que uma simples
leitura de reportagens da Folha de S. Paulo e da própria revista Veja
permitiria identificar que propinas pagas pela Alstom, e arrecadadas por
Andrea Matarazzo, alimentaram o caixa dois da campanha do ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso, em 1998. A
planilha a com contabilidade paralela foi revelada pela Folha em 2000,
confirmada pelo então tesoureiro tucano Luiz Carlos Bresser Pereira e
até por Veja. "Que teve, teve", dizia a revista, referindo-se ao caixa
dois tucano (leia mais aqui).
Agora, a Polícia Federal e o
Ministério Público começam a investigar o caso, que pode conectar
formalmente as propinas do metrô paulista à campanha de FHC. Batizada de
"siga o dinheiro", a investigação aponta o ex-genro de FHC, David
Zylberstajn, ex-secretário de Energia de São Paulo, como um dos
responsáveis pela montagem do cartel.
Essa investigação da PF e do MP é
tema de reportagem deste fim de semana da revista Istoé, assinada pelo
redator-chefe Mário Simas Filho. Leia abaixo:
Campanhas investigadas
Ministério Público e PF
fazem rastreamento e encontram indícios de que parte do dinheiro
desviado no escândalo do metrô pode ter alimentado campanhas do PSDB,
inclusive a de FHC em 1998
Mário Simas Filho
O Ministério Público Federal e a PF
começaram na última semana uma sigilosa investigação que, entre os
procuradores, vem sendo chamada de “siga o dinheiro”. Trata-se de um
nome que traduz literalmente o objetivo da missão, que consiste em fazer
um minucioso cruzamento de dados já coletados em investigações feitas
nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil, seja pela PF, pelo Ministério
Público Federal e pelo MP de São Paulo, envolvendo os contratos feitos
pelas empresas Alstom e Siemens com o governo de São Paulo. “Temos
fortes indícios de que parte do superfaturamento de muitos contratos
serviu para abastecer campanhas do PSDB desde 1998, especialmente as de
Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas”, disse à ISTOÉ, na manhã da
quinta-feira 15, um dos procuradores que acompanham o caso. “Mas
acreditamos que com os novos dados que receberemos da Suíça e da
Alemanha chegaremos também às campanhas mais recentes.” Sobre a campanha
de 1998, os procuradores asseguram já ter identificado cerca de R$ 4,1
milhões que teriam saído de contas mantidas em paraísos fiscais por
laranjas e consultores contratados pela Alstom para trafegar o
superfaturamento de obras do Metrô, da CPTM e da Eletropaulo. “Agora que
sabemos os nomes de algumas dessas empresas de fachada será possível
fazer o rastreamento e chegarmos aos nomes de quem participou das
operações”, diz o procurador.
Dos cerca de R$ 4,1 milhões, os
procuradores avaliam que R$ 3 milhões chegaram aos cofres do PSDB
através de um tucano bicudo, já indiciado pela Polícia Federal. Trata-se
do atual vereador Andréa Matarazzo, ex-ministro de FHC, secretário de
Covas e Serra. Em 2008, quando explodiu o esquema de propinas da Alstom
na Europa, documentos apreendidos por promotores da França mostravam que
a empresa pagou “comissões” para obter negócios no governo de São
Paulo. De acordo com memorandos apreendidos pela justiça francesa, a
Alstom pagava propinas equivalentes a 7,5% do valor dos contratos que
eram divididos entre as finanças do PSDB, o Tribunal de Contas do Estado
e a Secretaria de Energia. Em 1998, época em que teriam sido assinados
os contratos superfaturados, Matarazzo acumulava o comando da Secretaria
de Energia e a presidência da Cesp, as principais clientes do grupo
Alstom no Estado. Antes disso, em novembro de 2000, tornou-se pública
uma planilha que teria listado a arrecadação de campanha não declarada
pelo Diretório Nacional do PSDB. Segundo essa lista, Matarazzo seria o
responsável por um repasse de R$ 3 milhões provenientes da Alstom. Ele
nega. Diz que não fez arrecadação irregular de recursos e que apenas
reuniu alguns empresários para obter ajuda financeira à campanha, de
forma regular e declarada. Sobre o indiciamento, afirma que já recorreu
judicialmente.
Outro R$ 1,1 milhão que os
procuradores já têm rastreado teria vindo de contas mantidas por
empresas instaladas em paraísos fiscais. Uma dessas contas se chama
Orange e o detalhamento do esquema de recebimento do dinheiro vindo da
Alstom foi revelado ao Ministério Público paulista por um ex-lobista da
empresa, hoje aposentado, Romeu Pinto Júnior. No depoimento a que ISTOÉ
teve acesso, ele admite que recebeu no Brasil US$ 207,6 mil do Union
Bancaire Privée de Zurique, em outubro de 1998, e outros US$ 298,8 mil
em dezembro do mesmo. Agora, os procuradores estão seguindo outras duas
remessas feitas a Pinto Júnior pelo Bank Audi de Luxemburgo, entre
dezembro de 2001 e fevereiro de 2002. A primeira soma US$ 245 mil e a
segunda, US$ 255 mil. Todo esse dinheiro, segundo o procurador, passou
por uma empresa no Uruguai chamada MCA. Além dela, a equipe está
investigando contas em nome da Gateway e da Larey, ambas operadas por
Arthur Teixeira, um dos lobistas delatados pela Siemens ao Cade, e
identificadas como pontes para o pagamento de propinas.
Entre os documentos que o Ministério
Público Federal recebeu da Suíça e da Alemanha estão dados que podem
comprometer David Zilberstein. Segundo o procurador ouvido por ISTOÉ,
ele teria sido um dos pioneiros a estimular a formação de cartéis,
principalmente na área de energia. Só depois de rastrear todos os dados
bancários obtidos nas investigações feitas fora do País é que os
procuradores pretendem começar a tomar depoimentos. Os responsáveis
pelas investigações avaliam que a parte mais difícil do rastreamento
será feita a partir do próximo mês, quando pretendem fazer um paralelo
dos dados já levantados com o que poderá vir a ser fornecido por
empresas que trabalharam nas campanhas eleitorais.
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