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sexta-feira, 21 de setembro de 2012

ARTIGO DE OPINIÃO: À MANEIRA DE ÉMILE ZOLA : EU ACUSO!!!


À maneira de Émile Zola: Eu acuso!!!

imagem de Carlos Alberto L. Andrade

                    
        Diante do espetáculo midiático em que se transformou o julgamento da chamada Ação Penal 470, apelida pelo bufão dos programas policialescos da TV, Roberto Jefferson, de “mensalão”, vem-me à mente o episódio da famosa carta-artigo de Émile Zola quando do chamado “Caso Dreyfus” que mobilizou a sociedade francesa em 1898. Um caso que tinha por tema a defesa de um inocente condenado por erro judicial com base em relatórios “mentirosos e fraudulentos” que inocentaram um culpado e puniram um inocente.

“Meu dever é de falar, não quero ser cúmplice. Minhas noites seriam atormentadas pelo espectro do inocente que paga, na mais horrível das torturas, por um crime que ele não cometeu.”
   Émile Zola


       O Brasil assiste estarrecido ao Supremo Tribunal Federal - a mais alta corte do que seria a Justiça no sistema tripartite do Poder da União - se curvar à mídia partidarizada e, por chicanas típicas do mundo jurídico, levar ao banco dos réus um partido político, seu ideário e sua história, no mais triste episódio visto no país após a obscuridade dos anos de chumbo da ditadura. Um tempo quando o mesmo Supremo, de cócoras, se curvou aos poderosos de galões e armas e escreveu outro dos momentos deploráveis da vida nacional.

       Não o acuso pelo julgamento de culpados que por sua ambição se apropriaram de valores e bens públicos ou privados e por tanta vileza cadeia merecem. O acuso pela distorção de princípios fundamentais no resguardo aos direitos individuais tutelados pela Constituição que o Tribunal máximo se obriga a guardar e defender.

       Acuso a negra toga da intolerância que, por ineditismo e oportunismo eleitoral, muda preceito basilar da garantia do cidadão e introduzir, , em julgamento que envolve a dignidade e a liberdade o fascista conceito de culpabilidade pelo “domínio do fato” sobrepondo tão estranha tese à clareza da prova direta e da contra-prova devida.

       Acuso eminências e seus pares de afrontar o sagrado direito do voto do cidadão ao marcar julgamento e dimensioná-lo, por fatiamento e delongas, para levá-lo em milimétrica dosagem temporal a véspera de uma eleição quando a Nação se debruça sobre tantos “digo eu” e mútuos rapapés.

É a simulação em evocações de ocasião de prévia condenação de toda uma agremiação partidária e seu governo, com a aceitação por aquele que seria o julgador acima das partes, da plena voz da acusação da parte que condena. E disso, com sofreguidão, fazer o “é como voto” a sentença final de quem não tem sequer direito a duplo grau de jurisdição na avaliação daquilo que se lhe imputa.

       Acuso o claro viés sócio-partidário, pela sofreguidão em dar a um governo eleito e eleito e avaliado pela esmagadora maioria da Nação o carimbo da corrupção ajeitada pela “historinha de ocasião e pouco jurídica” contada a cada fato, sem liames de causa e efeito, apenas para se dar a um julgamento a força de tirar do povo a livre expressão de sua vontade trazendo a dura nódoa lançada sobre todo um partido e um governo.

       Acuso, por ver de volta suas excelências à postura de cócoras diante do onipotente quarto poder – a mídia em que vozes, desejos e interesses de seus ricos e bem postos barões que não admitem que um povo humilde ascenda aos degraus mais altos do extrato social e lhe façam sombra aos desmandos que por mais de quatro séculos nos deram a exploração desabrida das elites sobre os desvalidos e desassistidos, mera massa de manobra e uso e fruto para seu enriquecimento.

       Acuso suas excelências de deixarem de lado o ideal de Justiça e erigirem por primado de julgador a dúbia interpretação da Lei como forma de punir quem um dia se arrogou o direito de buscar vida melhor e mais digna pelo exercício pleno de sua soberania e garantias da Constituição. Uma norma máxima agora afrontada e estuprada sob as luzes dos holofotes que iluminam a busca sôfrega da notoriedade e do sucesso fácil.

       Acuso a deplorável subserviência aos poderosos de plantão em seus jornais e emissoras, seus partidos de elite e vastos bens e rendas que no desvario por manter seus privilégios coopta até mesmo aqueles que por nascimento berço sofreram as agruras do preconceito e da carência, para agora se tornaram verdugos dignos da mais dura Inquisição travestida em votos com duvidosos e questionáveis fundamentos.

       Envergonho-me de assistir ao mais degradante e hipócrita dos julgamentos por ser aquele que fatia condutas e seleciona crimes iguais dando ao mais antigo tratamento benéfico do aguardo da prescrição em detrimento do mais recente, julgado sofregamente para que se atendam a interesses subalternos. E tudo para se dar um golpe travestido de força judiciária em clara afronta aos mais sagrados ideais de Justiça, equidade, independência e isenção.

       Acuso, por fim o Supremo Tribunal Federal de se transformar em uma casa da Justiça onde a venda que cobre os olhos da deusa Themis faz letra morta a conquista de um dos mais sagrados direitos do homem: o de ser julgado por juiz imparcial,  isento, livre de pressões e injunções e pleno a certeza de que inocentes serão livres e culpados condenados.

E, por fim, os acuso, aos não tão nobres Ministros, da inversão conveniente do ônus da prova para que se propague em páginas de jornais e redes sociais a imagem de juristas transformados em “heróis” da tirania de ocasião com a mais recente e perigosa forma de fascismo ditatorial. Uma forma de tirania já provada em golpes de Estado em plagas vizinhas, desferidos sob o manto das negras togas que escondem mesquinhas ambições.  


Carlos Alberto Lemes de Andrade
Jornalista e bacharel em direito

FONTE: BLOG DE LUIS NASSIF

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